Consumo

Café com sustentabilidade: uma receita possível

Quebrando paradigmas sociais e ambientais, agricultura regenerativa prospera nos cafezais de diferentes regiões do Brasil

Por: Beatriz Cossul Candiotti

O manejo sustentável no café não é tema apenas para as grandes empresas. O produtor orgânico Cid Manicardi, que atua junto à sua esposa Isa Taube do sítio Flor da Lua no distrito de Souzas, em Campinas, afirma que a aptidão pela cafeicultura é uma herança de família. Ele iniciou a produção de café em 2008. “Meu bisavô veio da Itália para trabalhar no café em 1890 aproximadamente, trazendo meu avô ainda pequeno, que desde sempre trabalhou com café, da lavoura à torrefação”, comenta. Com a habilidade do cultivo já entre seus antepassados, Manicardi encontrou em seu interesse pela microbiologia, o elo entre suas duas profissões, endodontista e cafeicultor.

O produtor Cid Magicardi aponta que a agricultura regenerativa é a esperança de um futuro viável (Foto: Luana Taube)

Com uma gleba de apenas 1.000 m², Cid e Isa iniciaram o cultivo no sítio, que recebeu o nome inspirado em suas duas filhas, Flora e Luana. O produtor assume que inicialmente não havia um desenvolvimento sustentável, uma vez que, segundo ele, “desenvolvimento sustentável é mais do que sustentabilidade, pois a expressão carrega o termo desenvolver, avançar, e aí entra a agricultura regenerativa, a que entrega um quadro melhor do que encontra”. Assim, durante 10 anos o casal aprofundou os estudos em permacultura, agroecologia e outras vertentes que buscam o respeito à natureza, às demais espécies e à saúde humana, adotando a agricultura regenerativa no cafezal em 2018.

O cafezal é bem adensado, já que está consorciado com outras espécies, árvores e arbustos nativos, muitas frutas, em especial a banana. Com podas frequentes, Cid Manicardi retira carbono da atmosfera, que se acumula no solo e gera material orgânico. “É uma reciclagem intensa de nutrientes”, constata. Para o produtor, conseguir plantar cinco hectares de alimentos sobrepostos em um sítio que teria capacidade para produzir apenas um hectare é uma realização. O sentimento, revela, é de missão cumprida com o ato de equilibrar a boa vida da família enquanto regenera, também, a vida presente na mata e no solo.

Vanderlei dos Reis afirma que, quanto menos adubos químicos no solo, melhor será sua biota (Foto: Beatriz Candiotti)

Do sudeste ao nordeste, o manejo sustentável do café se alastra Brasil à dentro. Desenvolvido por Vanderlei dos Reis e José do Espírito Santo, o Projeto Selo Verde apropriou-se da sustentabilidade para quebrar os paradigmas da região. No oeste baiano, próximo ao município de Barreiras, o gerente Vanderlei e o agrônomo José se aventuraram no cafezal da Fazenda Oiti, obtendo sucesso mesmo com as adversidades climáticas, como a temperatura acima do ideal para o café e as chuvas mal distribuídas ao longo das safras, entretanto, aproveitando o excesso de luminosidade local. Com uma redução de 70% do uso de agrotóxicos em lavouras que já tinham entre 16 a 18 anos de idade, o projeto teve início em 2017, objetivando a produção de um café sustentável que prosperasse na Bahia.

José e Vanderlei afirmam que a proposta é produzir de forma diferente do método adotado na região, com novas práticas de adubação, nutrição foliar, bio-estimulação e controle fitossanitário, práticas menos agressivas ao meio ambiente. “O uso de podas de renovação, originando matéria orgânica, assim como o uso de microorganismos que atacam suas partes desmineralizadas e que tornem o fósforo presente nela mais disponível, geraram impactos positivos”, observa o agrônomo.

Resultado das podas de renovação na Fazenda Oiti, que originam matéria orgânica para o café (Foto: Beatriz Candiotti)

A abundância de luz do oeste baiano faz com que cresçam novos ramos no café, obtendo de 30 a 40% a mais de crescimento, comparado a outras regiões, como Minas e São Paulo. Entretanto, as chuvas mal distribuídas e a extensa janela de maturação, período em que o grão amadurece, são fatores que, sem um bom manejo e estratégia, prejudicam a qualidade do café, principalmente no período da colheita. “No café, uma lavoura perene, tudo que acertamos ou erramos terá consequências para a planta por uma safra ou mais” assume José do Espírito Santo.

Herança dos cafezais: A primeira marca brasileira de café solúvel a ter a certificação de carbono neutro foi a linha Nescafé Origens do Brasil, recebida em março desse ano pelo The CarbonNeutral Protocol, principal framework de neutralidade de carbono. Na prática, a conquista representou a redução na emissão de 140kg de CO2 por ano. “É a mesma quantidade que 17 árvores nativas na mata atlântica podem sequestrar de carbono anualmente”, comparaTaissara Martins, gerente de ESG, Environmental, Social and Governance (Governança Ambiental e Social em tradução livre) de cafés e bebidas da Nestlé.

De acordo com a gerente, o compromisso da empresa com a agricultura regenerativa, prática para recuperar o solo, os recursos hídricos e a biodiversidade, iniciou em 2011, com o projeto Cultivando com Respeito. Já a linha Nescafé Origens do Brasil foi lançada em 2019, e tem como destaque ações no campo voltadas ao desenvolvimento da agricultura regenerativa.

Segundo a Agrobita, empresa especializada na implantação de práticas regenerativas na agricultura, as 1.500 fazendas da Nestlé são certificadas pelo Código Comum para a Comunidade Cafeeira e apresentaram uma redução de 70% da pegada de carbono. Foram os dados da última safra que trouxeram para a marca a certificação de produto Carbono Neutro. “Quando nos tornamos uma marca de carbono neutro, não agimos apenas nas fazendas, mas também provocamos o consumidor a refletir sobre o tema ao questioná-lo sobre qual é o impacto das suas escolhas e dos seus hábitos”, comenta Taissara Martins.

Mata adensada do sítio Flor da Lua, que conta com café, banana e outras espécies (Foto Luana Taube)

Para Taissara Martins, além da meta da Nestlé de obter 30% das principais matérias primas (leite, café e cacau) até 2025, a empresa acredita que as ações sustentáveis podem transformar a cafeicultura do futuro, que seria, segundo ela, “aquela que regenera e que devolve ao planeta mais do que retira”.

Já para a família Manicardi, de Campinas, o sítio Flor da Lua tem também o compromisso de zelar pelo equilíbrio entre natureza e sociedade. O projeto atende a maioria dos ODS, Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, da Agenda 2030 da ONU, com enfoque na erradicação da fome e pobreza, provisão de segurança alimentar e nutricional, melhora dos meios de subsistência, gestão dos recursos naturais e proteção do meio ambiente. “Muito além de produzir algum cafezinho saboroso, nosso projeto é motivar ações pelo exemplo e divulgação, que possam interferir positivamente para que evitemos o colapso de nossa sociedade”, afirma o produtor.

Orientação: Profa. Rose Bars

Edição: Gabriela Lamas


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