Ciência

Hidrogênio verde, uma nova fronteira energética do País

Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais cria método sustentável com insumos de baixo custo para gerar o gás

Por: Marina Fávaro e Sophia de Castro

Produzido a partir de fontes renováveis e abundantes, o hidrogênio verde é um recurso promissor e em desenvolvimento no campo da ciência e tecnologia energéticas mundialmente. Nesse contexto, o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), em Campinas, desenvolveu um método que une insumos de baixo custo e abundantes para melhorar a eficiência da fotoeletrólise, processo que usa energia solar para quebrar moléculas de água e produzir o gás. “O hidrogênio verde só pode ser produzido de uma maneira, e a fotoeletrólise é a ferramenta necessária”, disse o cientista Flávio Leandro de Souza, que coordena pesquisas sobre o tema na instituição.

Flávio Leandro de Souza: “Nós temos um desafio ambiental em que gostaríamos de desenvolver tecnologias que pudessem ser agregadas no nosso dia a dia de modo a diminuir a emissão de CO2 [dióxido de carbono]” (Foto: Arquivo pessoal)

A pesquisa do CNPEM já foi publicada nos periódicos Journal of Materials Chemistry A e Journal of the American Ceramic Society e apontou uma eficiente combinação entre dois elementos, o germânio e a hematita, para a geração de hidrogênio de forma mais limpa e sustentável. A hematita, óxido de ferro comum na natureza, é um excelente material para absorver a luz do sol, no entanto, é um mal condutor de corrente elétrica. Por outro lado, a inserção do germânio, elemento químico, no processo de fabricação da hematita aumenta o transporte de cargas que irão realizar a fotoeletrólise, ou seja, o elemento desempenha papel fundamental ao acelerar e facilitar a separação da molécula de água. “Estamos procurando materiais que sejam capazes de absorver a luz solar e, quando imersos em água, quebrem as moléculas”, explicou Souza. 

Apesar da eficiência da combinação entre germânio e hematita, os pesquisadores ainda estão trabalhando e investigando outros materiais viáveis economicamente e energeticamente para absorver a luz do sol e quebrar a molécula de água. “A fotoeletrólise ainda está aberta a estudos para melhorar a eficiência, a estabilidade e os custos. Estamos buscando materiais novos e mais abundantes na natureza”, disse o pesquisador. 

Ano passado, o governo federal instituiu o Programa Nacional de Hidrogênio (PNH2). Esse programa tem como objetivo aproveitar o potencial do mercado nacional para a exportação de hidrogênio verde, uma vez que 80% da matriz energética do Brasil é proveniente de fontes renováveis. “Pensando na posição do Brasil no mundo como um excelente exportador de commodity, se o Brasil produzir hidrogênio em alta quantidade, ele já vai estar dentro do escopo do Produto Interno Bruto”, avaliou o pesquisador.

Souza ainda completou: “acredito que o Brasil pode e venha a ser um grande exportador do hidrogênio verde. Apesar de não termos demanda para o abastecimento energético, o país tem processos e demandas internas que precisam de hidrogênio, como para produzir fertilizantes e combustível de aviação. Talvez, se o Brasil utilizar essa fonte verde internamente, aumentaria ainda mais a sua sustentabilidade em termos de energia, tendo, inclusive, créditos de Carbono por emitir muito pouco”.

Para Flávio Leandro de Souza, em se tratando da produção de hidrogênio verde, o Brasil está em pé de igualdade com outros países (Foto: Divulgação/ CNPEM)

A produção do hidrogênio verde ainda enfrenta mundialmente desafios diversos, entre eles o alto custo de produção, infraestrutura necessária, eficiência no processo de produção e normas de segurança rigorosas devido à inflamabilidade do hidrogênio. “A tecnologia para a produção de hidrogênio verde existe e é comercial, mas é cara. Isso acontece porque os materiais que são aplicados na fotoeletrólise da água são caros”, destacou Souza. 

O hidrogênio tem atraído interesses de países e investidores privados por seu potencial energético. Um litro de hidrogênio contém três vezes mais energia do que um litro de gasolina, com a vantagem de o hidrogênio não liberar substâncias nocivas quando é queimado. 

Atualmente, a indústria classifica o processo de extração de hidrogênio por meio de três cores: o cinza, o azul e o verde. O cinza é produzido principalmente a partir do gás natural, usando energia de combustíveis fósseis, como diesel ou carvão, e envolve a liberação de gás carbônico. O azul é o extraído do gás natural, também queimando combustíveis fósseis, mas o seu CO2 é capturado e enterrado no solo. O verde é obtido a partir da água e usando apenas energia de fontes renováveis. Por isso, é a versão mais ambientalmente sustentável, mas é também a que demanda quantidades enormes de eletricidade, segundo as tecnologias mais convencionais da extração do gás.

O CNPEM

Fundado em 1997 e sediado em Campinas-SP, o CNPEM é uma organização privada sem fins lucrativos. Sob a supervisão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o CNPEM opera quatro laboratórios nacionais, sendo eles: o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), o Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), o Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano) e Laboratório Nacional de Biorrenováveis (LNBR). 

Além dos laboratórios, que são responsáveis por realizar pesquisas nas áreas de Saúde, Energia Renovável e Materiais Renováveis, o CNPEM possui uma das mais complexas infraestruturas científicas do Brasil: o Sirius. Sendo um acelerador de partículas do tipo luz síncrotron, o Sirius é capaz de desvendar a microestrutura de materiais orgânicos e inorgânicos presentes na natureza. Conforme apontou Souza, os laboratórios trabalham conjuntamente para o sucesso das pesquisas; além disso, o Sirius possui papel estratégico na pesquisa sobre hidrogênio verde, uma vez que ele possibilita a compreensão microscópica dos materiais e dos processos. “O Sirius permite com que a gente olhe para as menores porções dos elementos e, com isso, conseguimos compreender a eficiência e as limitações dos elementos”, afirmou.

Orientação: Prof. Artur Araújo 

Edição: Suelen Biason


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