Destaque
Guilherme Bueno compõe equipe que investiga o aparelho de repressão do regime militar brasileiro (1964-1985)
Por: Vinicius Braga
Pelo menos 300 objetos, como pente, tinteiro e restos de jornais constam do acervo que pesquisadores de três universidades públicas estão estudando a partir de investigações forenses e escavação arqueológica realizada em agosto no prédio onde funcionou o maior aparato repressivo do regime militar – a sede do DOI-Codi, no município de São Paulo. No local, também foram encontradas inscrições nas paredes, sistematizando um calendário, e materiais que podem ser indícios de sangue, pois reagiram ao luminol.
O trabalho está sendo coordenado pelo Laboratório de Arqueologia Pública (LAP) da Unicamp, a partir de um grupo de trabalho composto por pesquisadores da Unicamp, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O grupo reivindica a transformação daquele prédio em um memorial que registre o período da ditadura militar no Brasil.
Deborah Neves, coordenadora do grupo de trabalho, afirma que o tombamento é uma necessidade, mas que ainda é preciso garantir a preservação. “Ao redigir a proposta de resolução de tombamento, a preocupação era garantir que não apenas o prédio fosse tombado, mas que o tombamento garantisse que as instalações seriam preservadas como elas estavam. Garantir essa preservação possibilitaria justamente fazer essa investigação que nos levou, por exemplo, a encontrar inscrições nas paredes”, ressalta a historiadora.
Fernanda Lima, historiadora e participante do grupo, explica que a Unicamp atua na parte da arqueologia pública e na análise de objetos. “A Unicamp, através do LAP, montou uma equipe multidisciplinar de arqueólogos e historiadores para fazer a análise, restauração e conservação desses objetos. Alunos da universidade e voluntários de outras faculdades tiveram cursos com arqueólogos e estão na etapa de restauração dos objetos neste momento”.
Apesar de o trabalho contribuir com a história do local e, consequentemente, a história do Brasil na ditadura, ele também busca agregar informações ao debate sobre o impacto desse período nos dias de hoje. “Nós fizemos oficinas, debates, visitas mediadas e calculamos em torno de 900 pessoas atendidas nesses doze dias. Isso mostra que existe um interesse das pessoas em conhecer essa história, em saber mais e contribuir para a transformação do presente” comenta Deborah.
Nessa etapa da investigação, o grupo de trabalho utilizou três tipos de arqueologia: escavação, forense e pública, com o objetivo de preservar o passado e contribuir com o presente. “Precisamos tornar aquele espaço vivo, tornar visível o processo de que ali se torturavam pessoas que foram sequestradas politicamente. Ter essa materialidade com a arqueologia pública é como colocar mais um tijolo nesse processo de tornar o espaço um memorial”, afirma Fernanda.
Deborah também lembra que o trabalho dos pesquisadores é adicionar elementos à história. “Ninguém tem dúvidas de que, naquele local, ocorreram violações de direitos humanos, mas cada elemento que a gente acrescenta a essas histórias contribui para entender como funcionava o espaço e como era a vida das pessoas que estavam sequestradas ali”, afirma.
O DOI-Codi era um dos órgãos responsáveis pela prisão de opositores ao regime militar brasileiro, que ocorreu de 1964 a 1985. É estimado que mais de sete mil pessoas foram torturadas nas instalações do prédio atualmente investigado. Uma ação civil pública que pede a criação do memorial está tramitando na Justiça.
Orientação: Prof. Carlos Zanotti
Edição: Melyssa Kell
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