Destaque

”A mulher deve falar o que sente para superar o trauma”

No Agosto Lilás, a psicanalista Alexandra Kwouwel diz como a terapia ajuda vítimas de violência

Por: Beatriz Borghini

A quinta edição da campanha “Agosto Lilás”, organizada pelos Ministérios Públicos estaduais, busca alertar a população sobre a importância do combate à violência contra a mulher e sua prevenção. Durante todo o mês, os MPs estão realizando diferentes ações, como palestras e publicações em redes sociais, que explicam o que é a violência doméstica e reforçam que as denúncias podem ser feitas por telefone (180), na Central de Atendimento à Mulher.

Com o início do isolamento social imposto pela pandemia da Covid-19 em março, houve um salto de denúncias de violência no telefone 180: em abril, o aumento foi de 18% em relação aos primeiros meses do ano (janeiro e fevereiro)  Os dados são do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMDH). E, desde 2017, com a sanção da lei que garante atendimento médico e psicológico às vítimas de violência doméstica pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o amparo dessas mulheres já é garantia na Constituição.

 

Digitais por telefone, Alessandra Krouwel, 27, psicanalista especializada pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) no tratamento do abuso sexual, que atende em clínicas na região de Campinas, explica como se dá o tratamento dessas mulheres após esse trauma, fala dos riscos de uma possível volta a situações abusivas e destaca a importância de acompanhamento psicológico durante um longo período, para que elas consigam superar o trauma.

Digitais: Estamos no mês do Agosto Lilás, que é o mês de conscientização pelo fim da violência contra mulher. Por que você considera tão difícil as mulheres denunciarem essa situação de violência que estão passando?

Alessandra Krouwel: Acredito que o mês do Agosto Lilás é muito importante para nossas conquistas e progressos como mulheres. A dificuldade dessa denúncia muitas vezes se dá pela culpa que essa mulher sente, o que a faz ficar com medo e receio da situação posterior, da atitude que o agressor possa tomar. Se essa mulher ainda não consegue se sustentar, isso é ainda mais complicado, porque ela muitas vezes depende dessa pessoa para se manter.

Ainda sobre este mês, no dia 7 de agosto ocorreu o aniversário de 24 anos da Lei Maria da Penha, lei que estabelece que todo o caso de violência doméstica é crime e deve ser remetido ao Ministério Público. Qual a importância que você, como psicóloga, vê nessa legislação?

Eu infelizmente atendi mulheres em diversas situações de agressão, sejam físicas ou psicológicas, e compreendi ainda mais sobre isso no meu estudo de pós-graduação. Vejo que o tratamento dessa vítima não acontece somente com o apoio psicológico. Ela precisa ficar longe do agressor.  Tendo esse direito de proteção garantido por lei, a segurança dessa vítima aumenta substancialmente.

Sabemos que em uma relação violenta existe o ciclo da violência (aumento da tensão, ato da violência e fase da “lua de mel”, em que a vítima recebe carinho e presentes como desculpa). Quando a mulher supera esse período e consegue se desvincular da situação de agressão, essa mulher também passa por ciclos no seu tratamento?

[caption id=" attachment_26324"="" ] (Infográfico: Beatriz Borghini)

É um pouco complicado mapear exatamente um padrão. Cada mulher tem vivências distintas, e o apoio da família também afeta muito nesse momento pós denúncia. Mas um quadro similar em praticamente todas as vítimas é a oscilação de dois momentos. O primeiro é a fase de culpabilização, em que ela acredita que deveria ter feito mais pelo relacionamento, não ter irritado tanto seu agressor. Ela se confunde, lembrando as fases de carinho no relacionamento. Já na segunda vêm as memórias da agressão. Ela relembra os momentos de violência que possivelmente causarão nela um medo constante desse agressor [Veja infográfico à dir.].

Ainda sobre o que acontece depois da agressão, qual é o trabalho psicológico para que essa mulher volte a ter autoestima?

Para que a paciente se cure do trauma e tenha sua autoestima recuperada, primeiro a mulher precisa falar sobre o que ela sente, como ela compreende o que ocorreu, para que depois, no progresso da terapia, ela consiga elaborar aquele trauma. Como consequência disso, ela vai reconhecer e valorizar todo o potencial que ela tem para trabalhar ou retornar ao trabalho. A ideia é que ela se sinta confortável e sem medo se desejar ter outro relacionamento.

As taxas do transtorno do estresse pós-traumática, em mulheres vítimas de violência, pelo parceiro íntimo, variam entre 45% e 60%. A vítima desse trauma tem mais probabilidade de se envolver em um relacionamento abusivo de novo? Por que isso acontece?

Acredito que muito provavelmente a mulher faz a escolha amorosa pelo que ela compreende como amor. Essa relação costuma se mostrar na família: se o ambiente familiar em que ela cresceu foi de turbulência, isso se reflete na vida adulta. Eu acho que, se essa vítima não compreendeu que vivenciou essa relação abusiva, ela tem grandes chances de se envolver novamente nessa situação.

Que mensagem as mulheres precisam ouvir nesse momento?

A mensagem que eu gostaria que todas essas mulheres que passaram ou que estão passando por essa situação de violência ouvissem é: Não desistam de si mesmas. A esperança de se recompor é essencial nesse momento. Sempre existe alguém que vai amá-las e tratá-las com respeito, da maneira que todas as mulheres merecem ser tratadas.

Orientação: Profa. Juliana Doretto

Edição: Sofia Pontes


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