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As regiões do cérebro envolvidas são próximas das relacionadas às emoções, humor, conduta e apetite
Por: André Romero e Natália C. Antonini
As vendas de caixas de medicamentos antidepressivos e estabilizadores de humor passaram de 105 milhões, em 2021. Os relatórios anuais mostram um aumento gradativo de 22% durante o período do isolamento social entre 2019 a 2021. Os dados foram estruturados pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF), de acordo com as informações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Os estados de Minas Gerais, do Distrito Federal e de Santa Catarina foram os que mais gastaram na compra de remédios antidepressivos. Os dois primeiros acima de R$ 6 mil e o terceiro gastou R$ 5,61 mil, por 100 mil habitantes. O estado de São Paulo, foi o sétimo maior comprador.
L.A.,18 anos, começou tomar medicamentos antidepressivos e calmantes para ajudá-la a passar pelo isolamento social, em decorrência à Covid-19. “Me vi obrigado a passar muito tempo sozinho, apenas com meus próprios pensamentos, isso foi péssimo para mim.”
Com base nos pacientes da sua clínica, a psicóloga comportamental, pós-graduada em epidemiologia, Karla Leal acredita que o isolamento trouxe problemas psíquicos, mas que ocorreu a diminuição do preconceito por tê-los. “Ocorreu uma defasagem muito grande à socialização, o que não é interessante, pois somos seres sociáveis. Todos ficaram perdidos e isto faz com que a depressão se desenvolva nas pessoas. Mas há a busca constante da terapia, pois as pessoas descobriram que é uma profilaxia à saúde mental”, relata.
No caso de L.A., o apoio dos pais, para o tratamento, foi muito importante para que a doença fosse suprida gradativamente. “Procurei ajuda profissional quando percebi que meus dias eram resumidos em chorar e não sentir vontade de viver. Foi bem difícil. Também evito tomar os antidepressivos, mas sei que eles me ajudaram a passar por uma fase conturbada” disse.
Para a psicóloga, o psiquiatra nem sempre é necessário pois o principal tratamento é a mudança de hábitos, porém também é a parte mais difícil. “É bem mais cômodo ir ao psiquiatra para receber medicação, mesmo que isto não trate os efeitos duradores e construtivos da vida da pessoa”, disserta.
Para o professor e chefe de departamento de psiquiatria da PUC-Campinas, Eduardo Teixeira, as medicações são muito seguras em relação a geração de algum problema sucessivo, mas informa que é necessário analisar periodicamente o paciente. “O uso crônico de antidepressivos pode afetar algumas áreas, o maior exemplo é o apetite, que caso aumente pode acarretar em obesidade e, posteriormente, a diabetes.”
Ambos entrevistados acreditam que é necessário ter uma rede de profissionais, sendo eles nutricionistas, professores de educação física, além do psicólogo e do psiquiatra, para o tratamento da depressão.
A doutora em sociologia e professora da PUC-Campinas, Stela Cristina de Godoi, concorda que o mundo moderno é ligado ao estresse, à má alimentação, ao uso excessivo de telas, às trocas de turnos do sono e à falta de exercício físico. “A depressão acaba sendo uma grande tendência, e isso aumenta com o home office, por exemplo, já que dificulta a separação da vida pessoal e profissional, fazendo com que os trabalhadores fiquem mais tempo trabalhando e menos cuidando de si mesmo, além do grande isolamento das outras pessoas”, relata.
Seguindo essa lógica, a socióloga afirma que a globalização é uma grande responsável pelo atual aumento gradativo no quadro de ansiedade e depressão. Ela explica que esse fenômeno está diretamente ligado com uma percepção de aceleração do tempo social, sentida principalmente graças ao mundo virtual e conectado que vivemos. “Atualmente, com uma mescla de funções no espaço físico e virtual, somos obrigados a ser multitarefa nos afazeres, o que gera a sensação de tempo acelerado. É impossível isso não resultar num sentimento de maior ansiedade”, diz.
Durante todo o ano de 2021, 9,3% dos brasileiros apresentaram algum tipo de transtorno de ansiedade, totalizando 18,6 milhões. Além de que nos dois meses após o maior pico de isolamento social, ocorrido em março, com a taxa de 62,2%, 8 em cada 10 residentes do Brasil, com idades intermediárias entre 18 e 92 anos, estavam sofrendo algum tipo de transtorno ansioso, de acordo com a pesquisa realizada pelo Ministério da Saúde.
Para Karla Leal, o quadro ansioso é preocupante pois ele costuma ser substancial para o desdobramento de outras doenças. Isto porque o ansioso tem pensamentos focados no futuro, desatentando às ações presentes, o que acarreta outras doenças psíquicas, entre elas, a depressão. Então, para a prevenção do distúrbio mental da depressão, é necessário que os transtornos ansiosos sejam tratados da forma correta.
Isso se torna uma problemática para o Brasil pois é considerado o país mais ansioso no ranking da Organização Mundial da Saúde (OMS), desde 2017. Havendo, antes da pandemia do coronavírus, em 2019, 40 milhões de brasileiros ansiosos, dados informados, também, pela OMS.
Em contrapartida, o brasileiro é considerado o que mais pensa na saúde mental. 75% da população afirma pensar com frequência, enquanto a China é o país que menos pensa, com 39%, segundo dados do relatório produzido pela Ipsos, World Mental Health Day.
De acordo, também, com o relatório World Mental Health Day, as mulheres e os menores de 35 anos são os grupos que pensam mais na saúde mental, 24% e 28%, respectivamente. Já os homens e a população com mais de 50 anos são os que menos pensam 18% e 13%, nesta ordem.
Crise econômica
Segundo a socióloga Stela de Godoi, as pessoas com níveis socioeconômicos baixos têm maiores incidências de doenças mentais. Com isto, a crise econômica, estimulada pela crise sanitária da Covid-19, desestruturou as áreas empregatícias, ocasionando a mudança forçada dos hábitos do brasileiro. “Nós temos um mundo muito desigual economicamente, de um lado um grupo da população que está inserido no mercado de trabalho, que está vivendo sobrecarregado. E, do outro lado tem um grupo mais populoso, que empobreceu muito, na qual ficou excluído do mercado de trabalho ou com vínculos trabalhistas precários”, relata.
O grupo empobrecido pela professora cresceu diante o desemprego que chegou em seu ápice em setembro de 2020, com 14,9%, ficando em quarto lugar no ranking mundial, atrás apenas da Costa Rica, Espanha e Grécia, segundo a elaboração de dados da Austin Rating, a partir dos institutos nacionais de pesquisas dos países, no caso do Brasil, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), além do Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A medida que o desemprego cresce, o desalento e a informalidade também crescem. Com base nas informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada pelo IBGE, no último trimestre de 2021, o número de desalentados foi de 4,8 milhões, sendo a primeira vez abaixo do 5 milhões, desde 2020. O maior número foi no primeiro trimestre de 2021, com 5,9 milhões de desalentados.
A diminuição de desalentados não significa que o desemprego conjuntural, causado por crises econômicas, se ajustou. No Brasil 4 em cada 10 ocupados são informais, superando em 3,7 milhões de pessoas da formalidade, segundo dados do IBGE.
Levando em conta estes fatores, o endividamento e a insegurança alimentar aumentam na sociedade. Em 2022 o brasileiro bateu recorde de endividamento, desde 2012, com 77,5% da população inadimplente, 10,3 pontos percentuais acima de 2021. O dado é da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor, da Federação Nacional de Comércio de Bens, Serviços e Turismo (PEIC). A consequência disto é a insegurança alimentar, segundo informações preparadas pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) com base na Gallup & Robinson, a insegurança alimentar do Brasil em 2021 foi de 36%, enquanto a média mundial foi de 35%, com o grupo mais afetado sendo o das mulheres.
“Esses são fatores que normalmente ignoramos, a ameaça de não ter perspectiva de compras básicas para a sua família, se vai ter comida ou não, ainda mais o aumento no preço dos alimentos. Isto gera a insegurança alimentar, e consequentemente, o adoecimento mental”, conta Stela.
Contradição das recomendações
Além de diferir das recomendações dos especialistas entrevistados, que estão de acordo com os estudos científicos atuais, as adversidades socioeconômicas sofridas pelos brasileiros impactam na saúde mental da população. Segundo as advertências feitas pela OMS, as pessoas devem praticar 150 minutos por semana de exercícios físicos de intensidade moderada, mas a taxa caiu em 7%, do período pré-pandêmico até agora, passando a ser 30% da população mundial que segue as orientações.
O consumo de legumes e verduras foi de 43% para 38% dos entrevistados brasileiros no levantamento desenvolvido pela Vital Strategies e pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), com apoio da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), neste ano.
A falta de exercício físico e a má alimentação causam uma queda na saúde da população, segundo o levantamento da UFPel, 91% dos brasileiros classificam a saúde como ruim, e destes, 41% tem diagnósticos de depressão.
A psicóloga Karla Leal explica que a interpretação desses dados fazem sentido quando falamos em doenças psíquicas, visto que não há separação das ações da mente e do corpo, ademais de dependerem um do outro para ter uma saúde plena e estável.
Acolhimento gratuito
No estado de São Paulo há quatro projetos que oferecem apoio psicológico gratuito e online. Dois na cidade de São Paulo: Apoio Psicológico Online do IPUSP para Comunidade USP e Escuta Sedes. Um em Santos, na Clínica Aberta de Psicanálise. E, por fim, um em Campinas, na Estação Psicanálise. Também existe, para todo o Brasil, o número anônimo com funcionamento de 24 horas, 188, do Centro de Valorização da Vida (CVV).
Orientação: Prof. Gilberto Roldão
Edição: André Romero
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