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Tradição da preservação das vivências vem se modernizando com novas iniciativas
Por: Maria Vitória Porto e Luiza Pessopane
“Meu cabelo já foi assim?” pergunta João Gabriel Fernandes, 19, ao se deparar com mechas onduladas escondidas entre as dobras de um lenço branco com manchas amareladas, denunciando o tempo que ficou guardado. A analista de pesquisa e desenvolvimento de embalagens, Aneuma Fernandes da Silva, 46, mãe de João, não traz somente as mechas, mas vai espalhando na mesa da cozinha todas as lembranças que guardou de seus dois filhos ao longo da vida. Dentinhos, sapatos, roupinhas, fotos, uma pasta cheia de documentos com certificados e desenhos.
Em meio às recordações, encontra-se uma camiseta pequena de algodão, com a estampa de uma foto. O grupo de crianças representado na imagem é seguido logo abaixo com os dizeres, “Turma do Peixe”. Trata-se da turma de primário de João, onde ele se encontra de pé, ao lado da professora.
Aneuma se encanta ao relembrar os momentos marcantes da infância de seus meninos. Ela diz que aprendeu a guardar tudo com sua mãe, a qual também não se desfazia dos objetos de seus filhos. “Aprendi com ela. Minha mãe guardou minha fronha de recém-nascida, acredita? A fronha vem vindo comigo e vai embora comigo, ou vai ficar para meus filhos e netos” declara.
“Quando não se guarda, vai tudo com o tempo, com a memória” diz Aneuma, que completa: “a gente sempre descobre que o início de tudo era muito bom”. João se emociona ao ver todos os objetos guardados por sua mãe, e diz que sente “gostinho de infância” ao revirar tantos tesouros. Para ele o mais divertido é o álbum de fotos de sua festa de aniversário com o tema “Carros” em que ele e seus coleguinhas aparecem com máscaras de papel.
Em meio a tantas lembranças, Aneuma diz manter apenas o que lhe traz boas recordações, e que em suas duas gestações, devido a todas as complicações e mal-estar, restou poucas fotos, tendo apenas uma da espera de João. “Sempre tive depressão pós-parto, e mesmo minhas duas gravidez terem sido planejadas, o período de gravidez foi ruim, para mim não foi nenhum estrelismo” e completa: “o fato de ter acontecido tudo isso, não diminui o amor e a grandeza de ser mãe”.
Toda família possui histórias
As dificuldades do período da gestação foram vivenciadas também pela professora aposentada, Benedita Ferreira Crispim, de 64 anos. Mais conhecida como Léia, a professora que nunca esperou a gravidez, teve sua primeira e única filha aos 42 anos. “Para os médicos a chance da Maria Eduarda nascer com Síndrome de Down era muito grande” diz Benedita. Maria Eduarda Crispim, de 22 anos, nasceu um dia antes do Dia das Mães.
Assim como Aneuma, Benedita também guarda consigo objetos que remetem à infância de sua filha. Maria Eduarda explica que se tornou tradição a confecção de pingentes com seus dentes de leite que caiam. “Todo dente que caía eu falava ‘a vó vai fazer pingente’. Virou uma tradição que quero passar para frente”, diz Maria Eduarda, se recordando também de sua avó Emília. “Eu tive várias mães. Minha avó e a minha tia que também é falecida. Minha avó foi para mim uma mãe, porque quando eu nasci ela veio para cuidar de mim enquanto meus pais trabalhavam”.
Benedita e a filha não guardam somente objetos, mas principalmente momentos que as divertem ainda hoje, como quando Maria Eduarda, aos cinco anos de idade, confrontou um ladrão, que durante um assalto, tentou levar o seu ovo de Páscoa. “Ele era especial, não queria que o bandido levasse meu ovo. Podia levar tudo, podia levar o carro, o ovo não”, diz aos risos e conclui: “ele não levou”.
Eternização destas lembranças em joias afetivas
Para muitos como Aneuma e Benedita, as recordações são sinônimo de objetos, e foi com esse intuito, de materializar e eternizar momentos e lembranças que Thaynara da Silva Paixão, de 25 anos, tendo estudado biomedicina, ingressou no empreendimento de joias afetivas. Seu interesse se deu em 2021, ao se deparar com vídeos no Instagram, das produções de chaveiros com o material da resina epóxi. A produção é feita com o encapsulamento do objeto com a resina moldada na forma que o cliente desejar. Não demorou muito para que a empresária expandisse suas produções além dos chaveiros, e aumentasse seu catálogo.
Uma de suas produções mais famosas são joias produzidas com DNA, em que as mamães enviam leite materno e até dentinhos para confecção de colares. “Mandei mensagem para uma amiga que estava amamentando, aí eu falei para ela que estava fazendo algumas joias e que ia precisar de leite materno e perguntei se ela me emprestava.” diz Thaynara, com a voz se misturando a gargalhadas ao se lembrar de sua amiga que teria sido sua “cobaia”, e ela ainda completa: “ela amou, porque o leite materno é um alimento que une mãe e bebê, mas que é finito. Tem uma época que ele acaba”.
Ao ser questionada sobre a trajetória de seu empreendimento, Thaynara se recordou de histórias que ainda a emocionam. “Eu tive três histórias que mais me marcaram, a última me deixa emocionada só de lembrar. Uma moça me mandou um bilhete junto com as cinzas da filha dela em um potinho pequenino. A filha dela tinha partido há três meses”, recorda Thaynara, que vai resgatando não somente as histórias tristes, mas a gratidão que foi direcionada a ela após o recebimento das joias. “Tive uma história de uma mãe de Minas Gerais. Ela mandou uma mensagem dizendo que o filho tinha falecido em um parque de diversões. Ele tinha oito anos na época e ela me mandou os dentinhos dele e a pedido da mãe colocamos atrás uma estrela de Davi” e adiciona “foi uma das joias mais lindas que produzi”.
Mas Thaynara não esquece dos sufocos. “Uma vez uma mamãe enviou um leite com muita gordura, e foi difícil achar o leite líquido branco em meio a tanta gordura, pois já estava amarelando. Depois a moça que tinha me enviado disse que tinha sido as últimas gotas”. Thaynara concilia seu negócio próprio com um serviço CLT e diz que sonha o dia em que poderá se concentrar apenas naquilo que ama fazer, mas que, por enquanto, vai trabalhando como pode e tenta registrar e divulgar suas produções pelo perfil. “Poder eternizar momentos, traz para a mãe acalento, de ter visto seu filho crescer. É algo que remete muito carinho e sentimento. O mais legal é que quando o filho crescer ele vai poder ver sua própria história.”
Orientação: Prof. Gilberto Roldão
Edição: Giovanna Sottero
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