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Jovens são sequestrados pelos algoritmos, adverte psicólogo

O resultado, segundo Ilan Brenman, é a falta de interesse pelo mundo fora das telas

Por: Rafaela Oliveira

O psicólogo e escritor Ilan Brenman, no Café Filosófico: “… a mente da criança começa a se enfraquecer, a relação dela com o mundo fica estranha e ela começa a adoecer” (Foto: Rafaela Oliveira)

As novas gerações nascem num mundo de transformações diárias, onde o a experiência concreta se desfaz em nuvens que mudam de formato a cada instante, sequestrando-os através dos algoritmos que regem as redes sociais. A advertência é do psicólogo e escritor Ilan Brenman, em conferência na gravação do Café Filosófico, na quinta-feira (1º). Especialista em educação, ele explicou como a tecnologia mantém os jovens reféns, impactando o desenvolvimento social e cognitivo deles.

Segundo Ilan, as amarras invisíveis da internet agem de maneira sutil na mente acostumada desde jovem ao ritmo acelerado da vida moderna – como um sapo aquecido gradativamente em uma panela. A leitura de um livro ou texto com mais de 280 caracteres, por exemplo, teria se tornado uma tarefa árdua, já que manter a concentração é uma batalha para o animal tecnológico, como aponta o livro “A Geração Superficial: O Que A Internet Está Fazendo Com Os Nossos Cérebros”, de Nicholas Carr, que ilustrou as falas do conferencista.

Essa falta de interesse pelo mundo fora das telas não é algo limitado aos jovens, os pais e responsáveis também fazem parte deste cenário e, pior, colaboram com ele, afirmou o psicólogo. “A gente bebe diariamente esse mundo acelerado e servimos como garçons esse copo aos nossos filhos”, exemplificou Brenman, que é mestre e doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Para o especialista, as telas deveriam ser inseridas na vida das crianças num processo lento e gradativo, tal como a alimentação: “Ninguém dá feijoada para um bebê!”, comparou.

O uso excessivo da internet e a falta de controle parental no ambiente virtual não coloca as crianças e jovens em apenas riscos imediatos – como cyberbullying e crimes cibernéticos –, mas os mantém presos em histórias curtas e rasas, exibidas em uma tela de rolagem infinita.

“Quando oferecemos histórias curtas, rápidas, sem emoção, sem o cerne dela, o que acontece? Essas crianças começam a reagir, a mente da criança começa a se enfraquecer, a relação dela com o mundo fica estranha e ela começa a adoecer”, apontou o psicólogo ao ressaltar que o Brasil está entre os países com as maiores taxas de uso de remédios para crianças.

Dentro desse contexto, Brenman ressaltou a importância da literatura desde o início da vida humana, pois, para ele, “é impossível compreender a condição humana sem a narração de histórias”. Presente na sociedade desde antes da Grécia Antiga, as criações literárias são construídas através de um elemento importante: a metáfora.

“Muitos cientistas têm falado da importância da metáfora, da ficção, para o mundo cognitivo de crianças. Eles falam que sem a metáfora, a ficção o cérebro tem uma grande dificuldade de compreensão de alguns conceitos, como: amor, amizade, entre outros”, disse.

Com mais de 60 livros infantis e infanto-juvenis publicados no Brasil e no exterior, Brenman reforça ao longo da palestra a importância da literatura para o desenvolvimento infantil. “ Se o cara que criou isso [Tik Tok] fala que não é para criança, o que ele dá para os filhos? Ele dá o que os gurus do Vale do Silício dão: livros. Enquanto eles dão livros, nós damos redes sociais, aparelhos eletrônicos e adoecemos nossas crianças e jovens”, afirmou. O especialista deixou claro que não defende o analfabetismo tecnológico ou saudosismo, mas que se deve ensinar os jovens a usar com parcimônia as redes, sem deixar que os algoritmos os controlem.

Para explicar a importância do cuidado com a infância, o palestrante leu um trecho do livro “O Mundo de Ontem”, de Stefan Zweig, que pondera: “a ascensão para o intelectual, a força interior da alma, se exercita unicamente naqueles anos decisivos de formação. É só quem aprendeu cedo a abrir as asas de sua alma, pode mais tarde abranger o mundo inteiro”.

Para Brenman é através da voz e das histórias, que um bebê vai se tornando humano, e que as crianças e jovens criam memórias duráveis, numa sociedade marcada pelas relações líquidas, onde quase tudo é passível ao esquecimento. Isso os prepara para a vida e a escola, explica o educador.

Libertar os jovens reféns das telas de rolagem infinita é mais difícil do que ensinar desde o berço a lidarem com a tecnologia, entretanto o educador defende que não é um trabalho impossível.  “A mente infantil é plástica, é possível fazer um trabalho com esse jovem que acha que não gosta de ler”, disse.

Segundo o psicólogo, não basta apenas dizer para o filho ser um leitor, é necessário ser um exemplo a ser seguido e manter, nem que seja em uma cesta, uma pequena biblioteca em casa. Os livros digitais – segundo ponderou – são uma intenção louvável, mas para as mentes enlaçadas pela impaciência se tornam uma fuga fácil das páginas de livros para outras distrações.

Orientação: Prof. Carlos A. Zanotti

Edição: Melyssa Kell


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