Monique Ferreira quer comparar reações do público de 1957 com as reações do público atual

Por Bianca Velloso

O Grupo Casca de Teatro irá começar a temporada de encenação da peça Viúva, Porém Honesta nesta quarta-feira (15), às 20h, no Teatro Municipal Castro Mendes, com a íntegra do texto original do polêmico Nelson Rodrigues, datado de 1957. O objetivo é estudar como o público irá reagir a um texto de um dramaturgo conhecido por um vocabulário característico, fator que polariza a audiência em termos de avaliação. Essa proposta de estudo é parte da pesquisa de mestrado da diretora da peça, Monique Ferreira.

A diretora, irá protagonizar a peça pela primeira vez, desenvolve pesquisa sobre a recepção do público à obra deste cronista, jornalista e dramaturgo batizado de “anjo pornográfico” na biografia assinada por Ruy Castro. A partir de pesquisas na Hemeroteca Digital, Monique analisou as reações do público em 1957, ano que a peça foi escrita, e na década de 90, quando Marco Antônio Braz dirigiu o espetáculo. As críticas foram recolhidas em jornais das respectivas épocas.

“Eu queria fazer uma encenação para ver a recepção atual”, afirmou Monique, que cursa mestrado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), depois de ter concluído sua graduação em Artes Cênicas, em 2020, na mesma universidade.

Com essa vontade, Monique foi atrás da autorização dos direitos autorais para poder encenar a obra com o texto pensado e escrito por Nelson Rodrigues há 66 anos. “Muita gente me desencorajava e diziam que não iria dar certo”, confessou a estudante, que estampou um enorme sorriso após conseguir a autorização da família.

Ela disse que os familiares do dramaturgo fizeram exigências para que o texto fosse de fato preservado em sua integridade, o que foi assegurado pela diretora. Segundo Monique, foram realizadas várias trocas de e-mails para que explicasse detalhadamente a proposta do estudo do mestrado na Unicamp. Por isso, o fato de encenar com o texto original deixa a diretora orgulhosa.

“Reforçamos essa questão do texto na íntegra, porque muitas vezes as pessoas, quando pegam as obras do Nelson, acabam adaptando algumas palavras para trazer o texto para a contemporaneidade. O que estamos fazendo é pegar o texto exatamente como é para levar ao público da mesma forma que foi em 1957”, detalhou a diretora, que fez iniciação científica, na graduação, sobre a peça Anjo Negro, que Nelson Rodrigues escreveu em 1946.

Desta forma, quem for prestigiar o espetáculo irá ouvir palavras como: “supimpa”, “batatas” e “oras bolas”. São expressões que, segundo a diretora da peça, já “não cabem” na boca das pessoas na atualidade e, por esse motivo, as companhias de teatro acabam por adaptar o texto original.

Para fazer com que essas expressões “coubessem” na boca dos nove atores que vão encenar Viúva, Porém Honesta, o grupo fez rodas de estudo de outras obras para poder entender a fundo as particularidades do estilo rodriguiano.

Monique disse que incorporar esse vocabulário tão característico foi um dos desafios, além dos custos de produção. Ela afirmou que a recepção do público é um ponto desafiador, justamente o tema de sua pesquisa.

“No geral, Nelson Rodrigues é um dramaturgo polêmico. Eu comecei a recolher as recepções e percebi que são bem polarizadas, como todo trabalho dele. Existe um grupo de pessoas que o amam, já tem outro grupo que pensa que ele é retrógrado”, exemplificou.

Fã de Nelson Rodrigues desde a primeira obra que leu do dramaturgo, Boca de Ouro (1959), Monique disse que se sente parte do grupo que aclama o dramaturgo nascido pernambucano e criado no Rio de Janeiro. “Eu sou apaixonada, mas também consigo colocar na balança algumas coisas”, contou.

Monique disse que dois motivos a levaram a se apaixonar por Nelson Rodrigues. “A obra conversa bastante com os brasileiros, e tem essa questão da ambiguidade, que eu escolhi estudar. As pessoas que gostam tanto ou o odeiam tanto não são parte de um grupo específico”, explicou.

Por essa razão, Monique diz que não é tão comum ver peças do dramaturgo sendo encenadas pelos teatros. Ela disse que nesse processo de encontrar locais para encenar, várias vezes foi recepcionada com espanto e surpresa pelos responsáveis por teatros onde esteve.

A peça será performada na estreia no Teatro Municipal Castro Mendes e seguirá para a Sala dos Toninhos, no Espaço Cultural Maria Monteiro, e em outros dois espaços em Barão Geraldo: no Centro Cultural Casarão e no Departamento de Artes Cênicas da Unicamp. 

Sinopse

Viúva, Porém Honesta conta a história de Ivonete, uma jovem de 15 anos que, ao ficar viúva, não se senta mais. O Doutor JB, seu pai, diretor do jornal de maior circulação da cidade do Rio de Janeiro, apesar de nomear ministros até por telefone, não consegue solucionar o problema da própria filha. Para ajudar a solucionar o caso, convida três especialistas – uma ex-prostituta, um psicanalista e um otorrino. Para completar o grupo, o próprio Diabo aparece. A partir de então, o passado da viúva é analisado pelos especialistas que tentam desvendar o motivo da viuvez inconsolável. Outros personagens, como o marido morto, as tias solteironas e o médico ginecologista fazem parte dessa trama insólita e absurda.

Duração do espetáculo: 75 minutos; Classificação Etária: 16 anos; Ingressos a R$ 20 (inteira) ou R$ 10 (meia).

Orientação: Prof. Carlos A. Zanotti

Edição: Melyssa Kell