Destaque
O proprietário Francisco Prado Telles, na sua juventude, operava os projetores do Cine São Paulo
Por Aline Nascimento, Mariana Telles e Stella Miranda.
Aos 109 anos, o segundo cinema mais antigo do Brasil, o Cine São Paulo, instalado no Centro Cultural Nilson Prado Telles, fica no município de Dois Córregos, a 211 km de Campinas, no oeste do estado de São Paulo. Com sua longevidade, o centenário prédio da Av. D. Pedro I passou de espaço destinado a proteger a cultura de uma cidade de 27 mil habitantes à condição de protagonista da história da própria cultura cinematográfica.
Construído entre fevereiro 1910 e julho de 1912, o Cine São Paulo chegou ao município junto com a eletricidade. “Foi uma iniciativa do engenheiro Manfredo Antônio da Costa, um admirador da então nascente arte cinematográfica. Ele queria associar a chegada da eletricidade com a instalação de um cinema, como sinal de modernização”, explica o atual dono do prédio, Francisco Prado Telles, ou Seu Chico, como costuma ser chamado, aos 76 anos de idade.
Durante seus primeiros anos, período em que pertenceu à Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL), o prédio que abriga o cinema foi alugado a empresas cinéfilas. Em 1943, Nilson Prado Telles, pai do Seu Chico, que já tinha os direitos de exploração do cinema desde 1940, comprou o prédio e tornou-se o único proprietário.
Foi sob a administração da família Prado Telles que o Cine São Paulo viveu anos de glória, nas décadas de 50 e 60. “Eram vendidos pelo menos 15 mil ingressos ao mês, em uma cidade que à época tinha 20 mil habitantes. Eram exibidos até seis filmes diferentes por semana, e o local se tornou espaço de encontro de amigos e de namorados. O cinema fazia parte da vida social da cidade”, lembra Seu Chico, que naquele período ainda era uma criança.
Os longa metragens não eram a única atração do Cine São Paulo, cuja programação também incluía apresentações musicais, desenhos animados, jogos de futebol e, até mesmo, sorteios de sombrinhas. Semanalmente, a programação era informada pelo jornal local O Democrático.
Na década de 60, no auge de sua performance, o Cine São Paulo viu a população dois-correguense começar a trocar as tradicionais telas cinematográficas por aparelhos de televisão, culminando com a primeira suspensão de sua programação, em fevereiro de 1975.
Não tardou a que uma empresa de Botucatu (SP) alugasse o prédio para a mesma finalidade, mas não obteve muito sucesso, encerrando os trabalhos no último dia do ano de 1979. Em setembro de 1980, Seu Chico assumiu o empreendimento que herdou do pai. Durante o período em que administrava o cinema, na década de 1980, o filho dele, que também se chama Francisco, trabalhou no Cine São Paulo e se transformou no atual guardião das memórias daquela época.
“Reabrimos o cinema com o filme Superman, e foi um sucesso, ainda mais porque o cinema contava com imagem e som privilegiados. Foi algo inesquecível, o cinema lotou”, disse ao afirmar que o sucesso surpreendeu até mesmo os empreendedores.
Francisco Augusto Prado Telles, de 48 anos, conta que tinha muitas atribuições dentro do Cine São Paulo. “Era uma empresa familiar. Meu pai era o gerente, e eu o ajudava com relação às gestões, à parte burocrática. A minha mãe era a vendedora de ingressos, o meu irmão vendia balas e chocolates, e eu era o porteiro. Ficava ali, na sala do cinema, durante toda sessão. Ao final, abria as cortinas e as portas para pessoal poder sair”.
A chegada dos videocassetes foi outro duro golpe no empreendimento, o que levou a outro encerramento das atividades, em outubro de 1991. O fechamento foi temporário, porque em menos de um ano, a sociedade dois-correguense mobilizou-se para conservação do cinema, resultando no arrendamento do prédio para a prefeitura, e na criação do Centro Cultural Nilson Prado Telles, em setembro de 1992. O prédio foi colocado a serviço da cidade novamente, mas agora, com ingressos e atividades gratuitas. Em maio de 1998, teve recorde de público com um único filme, o Titanic, que em 25 sessões atingiu 5,5 mil espectadores.
Em 8 de maio de 2014, o Centro Cultural Nilson Prado Telles foi interditado por decisão judicial. “Alguém fez uma denúncia, de que o prédio não oferecia segurança. Em função do que havia acontecido com a boate Kiss, naquela época, estavam interditando tudo mesmo”, explicou a Danielle Soffner, de 39 anos, que esteve à frente da coordenação do cinema por mais de uma década.
“Eu empreendi a reforma do prédio para garantir a aprovação e o alvará do Corpo de Bombeiros, mas foi uma luta, uma luta árdua. Eu tive que arcar com todo o custo da obra”, explicou Seu Chico.
A restauração foi iniciada em 20 de janeiro de 2015, e o cinema conseguiu o alvará em 7 de agosto do mesmo ano. “Foi um belo investimento, e sem perspectiva de retorno financeiro, apenas para preservar o cinema. Foi o que despertou o interesse dos cineastas Ricardo Martensen e Felipe Tomazelli para a produção do documentário Cine São Paulo”, disse.
História ganha documentário
Pouco antes da reforma, os produtores de audiovisual Ricardo Martensen e Felipe Tomazelli, de São Paulo, ficaram sabendo que Seu Chico, para preservar o antigo cinema, iria financiar sozinho a reforma do prédio. Impressionados com aquela perseverança, os dois resolveram acompanhar a obra e documentá-la, resultando no longa metragem “Cine São Paulo”, que retrata o dia a dia da reforma até a reinauguração.
“Esse projeto começou no início de 2015, sem dinheiro, com muita raça, com muito amor e podendo representar uma história tão bonita de luta pela cultura”, contou Ricardo Martensen, um dos cineastas. As gravações iniciaram-se junto com a reforma, e fazem um paralelo entre o presente e o passado, mediados pelas memórias de Seu Chico, que sempre acabam se misturando com a história do Cine São Paulo.
Em 7 de agosto de 2015, o cinema foi reinaugurado com a exibição do premiado filme brasileiro Cidade de Deus. Aqui, acesso ao trailer no canal do Youtube do Festival É tudo Verdade.
Entrevista com Seo Chico, o guardião das memórias do Cine São Paulo:
Orientação: Ivete Cardoso Roldão
Edição: Fernanda Almeida
Edição do áudio: Vinicius Dias da Silva
Veja mais matéria sobre Destaque
Provão Paulista incentiva estudantes da rede pública
Desde 2023, a prova seriada se tornou porta de entrada para as melhores universidades do Estado de São Paulo
Sistema de Educação ainda requer ajustes para incluir alunos PcD na educação física
Apesar dos avanços na educação, alguns profissionais ainda se sentem despreparados para lidar com esse público nas aulas
Revolução na luta contra Alzheimer: Unicamp lidera avanços com IA na inovação farmacêutica
Pesquisas inovadoras unem tecnologia e biociência na busca de tratamentos eficazes para doença neurodegenerativa
Projeto social promove atividades pedagógicas em escolas de Campinas
São pelo menos 280 jovens mobilizados nos encontros e quatro escolas que abraçam as atividades propostas
Valinhos é eleita a cidade mais segura do Brasil em 2024
Uso de tecnologia e aumento de 30% no efetivo da Guarda Civil Municipal aumentam a segurança e a qualidade de vida na cidade
Novembro Azul destaca o papel da hereditariedade no avanço do câncer de próstata
Especialista explica como o fator genético pode acelerar o câncer masculino