Destaque
Encontro liderado por Jacqueline Damázio, especialista em combate ao racismo, debate heteroidentificação e equidade
Por: Isabela Meletti | Com colaboração de Laura Penariol
A discussão sobre ações afirmativas e cotas raciais foi o tema da palestra ministrada na noite desta terça-feira (5), na PUC-Campinas, por Jacqueline Damázio, gestora do Centro de Referência em Direitos Humanos na Prevenção e Combate ao Racismo e Discriminação Religiosa, que faz parte da Secretaria de Assistência e Desenvolvimento da Prefeitura de Campinas.
Durante a palestra, que teve a abertura realizada por Rafaela Meyer, estudante de Direito da PUC e membro do Centro de Referência, Jacqueline abordou os assuntos através das leis de ações afirmativas em vigor no Brasil e de exemplos que já vivenciou. “As cotas são importantes para garantir a equidade e a igualdade entre pessoas negras e brancas em uma prova de vestibular ou concurso público por exemplo, funciona como uma reparação, já que a população negra teve seus antepassados escravizados, o que comprometeu diretamente a vida dessas pessoas”, afirmou Jacqueline.
Com a abolição da escravatura, os escravizados não tiveram nenhum tipo de suporte ou assistência de moradia e emprego. De acordo com a gestora, essa situação histórica se entende por anos e gera consequências nas pessoas pretas e pardas até hoje. Por isso, a defesa das ações afirmativas, como as cotas raciais são essenciais para tentar equiparar a questão.
“A gente não pode esquecer que a população negra sempre foi um grupo historicamente discriminado aqui no Brasil e que o Estatuto da Igualdade Racial tratando das ações afirmativas voltadas aos negros definem como as políticas públicas são destinadas e reparadas às dimensões e desigualdades sociais nas esferas públicas e privadas também, porque o país precisa se comprometer com o combate a desigualdade racial”, explicou.
Algumas das legislações citadas por Jacqueline na palestra englobam a obrigatoriedade das cotas para pessoas negras, editais e categorias específicas e proteção do patrimônio cultural. No entanto, ela reforça que outras ações mais efetivas estão sendo pensadas e executadas por países como os Estados Unidos.
Jacqueline reforça que “as políticas públicas voltadas para essa população não podem se restringir as cotas raciais em universidades, porque é preciso pensar também na permanência do aluno na instituição, ou seja, de que forma e com quais recursos ele vai conseguir se manter durante sua graduação”.
Heteroidentificação
Jacqueline explicou ainda sobre o procedimento realizado para a validação da pessoa que se autodeclara negra e solicita participar de alguma cota racial. Segundo ela, o processo é feito por uma comissão, que deve ser composta por no mínimo cinco pessoas, brancas e negras, que vão avaliar o fenótipo do candidato através de traços como textura do cabelo, formato do nariz, do rosto e tonalidade da pele.
A necessidade da heteroidentificação surgiu em razão das inúmeras fraudes cometidas por pessoas que não tinham o direito as cotas, mas mesmo assim pediram a fim de se beneficiar em alguma colocação. “A heteroidentificação precisou ser criada por conta de candidatos fraudulentos, como foi o caso do servidor do INSS que tivemos em 2019. Agora, nós a utilizamos para validar as pessoas que solicitam as cotas”, relata Jacqueline.
Além disso, em seus trabalhos no Centro de Referência em Direitos Humanos na Prevenção e Combate ao Racismo e Discriminação Religiosa a gestora recebe denúncias de casos discriminatórios, mas percebeu que existe uma subnotificação nas queixas em função da dificuldade das vítimas e testemunhas entenderem o que é uma injúria e uma discriminação racial.
“Há um problema de subnotificação dos casos, porque muitas das vezes as pessoas não sabem diferenciar esses termos e não compreendem o que sofreram”, disse.
Durante o evento, Jacqueline evidenciou o preconceito enfrentado pelas pessoas negras por meio de vários exemplos que viu enquanto trabalhava dando formações em escolas e empresas. Ela reiterou que “o racismo sofrido por quem é preto ou pardo no Brasil denota a injustiça e desigualdade racial vivida no nosso país”.
Diálogos Sobre Racismos
O encontro, organizado pela Comendadora Edna Lourenço, está dentro da inciativa “Diálogos Sobre Racismos”, promovida pelo Centro de Estudos Africanos e Afro-Brasileiros Dra. Nicéa Quintino Amauro da PUC-Campinas (CEAAB PUC-Campinas), que realiza ações a respeito do tema racial com alunos, professores e funcionários da PUC-Campinas desde 2020.
No último dia 21 de outubro a série Diálogos realizou a palestra “Literatura infantil e juvenil com personagens negras”, proferida por Maria Fernanda Luiz, mestre em educação e especialista em psicopedagogia.
Na ocasião, Fernanda refletiu sobre a Educação Antirracista e a busca por possibilitar que todos, negros e não negros, tenham garantido seu direito de desenvolvimento integral. Segundo ela, o motivo das pessoas optarem por não trabalhar com a educação para as relações étnico raciais, ação pautada no artigo 26A da LDBEN, é o racismo.
Tratando-se da vivência em sociedade, o que ela observa é que não é considerada necessária a história e cultura negra. “Então é natural fazer uma boneca e usar um bombril para representar o cabelo de uma criança negra”, pontua.
A pesquisadora apresentou o caso do livro “O Menino Marrom”, de Ziraldo, no qual o personagem aparece descalço na narrativa, ao contrário do menino branco. Ela lembrou, ainda, que o único livro que tinha alguma representação de menina negra em sua infância era “Menina Bonita dos Laços de Fita”, mas que ainda assim sua mãe reforçou a pintura com cores para se aproximar da sua. Informações sobre o Centro de Estudos Africanos e Afro-brasileiros Dra. Nicéia Quintino Amauro da PUC-Campinas podem ser encontradas no endereço
Edição: Mariana Neves
Orientação: Prof. Karla Ehrenberg
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