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O grupo se reúne periodicamente em Campinas para trocar experiências sobre a criação dos filhos
Por: Sofia Furtado
“Minha maternidade solo começou na gestação. O primeiro episódio no qual eu pressenti isso foi quando o pai de meu filho me deixou sozinha, na sala de espera do pré-natal, para ir se encontrar com os amigos, saindo de carro e me deixando voltar de ônibus para casa, sem levar em conta que eu tive uma gestação de risco”. A queixa é da assistente editorial Bruna Potenza, 37 anos, que desde o período da gestação se sentiu a única responsável pelos cuidados com o filho.
Bruna é uma das integrantes assíduas do coletivo Mães Sol, que se encontra periodicamente em Campinas para que mulheres que decidiram ou se viram na contingência de encarar a maternidade sem a companhia do marido possam trocar experiências e refletir sobre a condição de terem se transformado em “mães solo”. O grupo se reúne em locais como consultórios, escolas e residências de suas integrantes.
Enfermeira e fundadora do coletivo, Ketib Kelian, de 40 anos, diz que um relacionamento entre casais muitas vezes pode não ser o sinônimo de uma divisão dos cuidados, o que geralmente deixa a mãe ainda mais sobrecarregada com os cuidados dos filhos.
“Mesmo em um relacionamento estável, você pode estar cuidando do seu filho sozinha”, aponta ela ao queixar-se da falta de cooperação do parceiro. A profissional da saúde diz que sempre se sentiu muito responsável pelos cuidados com seus filhos, João, de 14 anos, e Heitor, de 9 anos, mesmo quando ainda estava vivendo uma união estável.
Segundo Bruna, mesmo no período em que estava junto ao ex-marido, já considerava que vivia uma rotina de mãe solo e, agora, vive literalmente sozinha, ao lado apenas do Heitor, de 5 anos. Ela admite que a ausência da figura paterna faz falta, já que sua rotina de trabalho e cuidados com o filho é bastante cansativa.
“Trabalho 44 horas semanais, sendo que em dois dias da semana preciso ir para São Paulo. Além de tudo, tenho que administrar todas as atividades paralelas do meu filho, como escola, cuidados gerais e terapias”, afirma.
De acordo com uma pesquisa realizada pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI), nos cartórios civis do Brasil, só nos primeiros meses de 2022, foram registradas mais de 56.931 crianças apenas com o nome da mãe. Diante desse cenário, Bruna também entende ser necessária a criação de vínculos entre o pai e seu filho, já que é a partir dele que a rotina de cuidados e todo o afeto se estabelecem.
“Claro que, em um contexto de abuso, isso deve ser reavaliado. Mas, na maioria dos casos, a presença frequente e a criação de um vínculo afetivo por parte do pai se torna vital para a criação de um filho saudável”, reitera a assistente editorial.
Já Egle Veríssimo, de 42 anos, diz não ter se sentido sozinha durante a gestação, mas passou a viver a maternidade solo principalmente em 2020, durante a fase mais aguda da pandemia, quando teve que se responsabilizar pelos cuidados com seu filho de 9 anos, sozinha, já que, pela primeira vez após a separação, não estava contando com a ajuda de seus pais, com quem havia morado durante 2 anos.
Diante do novo cenário, a terapeuta e também uma das fundadoras do Coletivo Mães Sol, passou a admitir o papel paterno como essencial, já que ele também deve ser visto como uma figura de referência pelo filho.
“Eu não posso cobrar esta presença, cabe ao pai estar presente ou não. A parte afetiva e emocional ainda é importante e deve ser exercida, isso sim é o essencial, não apenas o ato de pagar pensão”, aponta Egle.
Gabriele Rufino, doula e estudante de psicanálise, de 44 anos, diz que sempre se sentiu sobrecarregada com a criação da filha, Maria Luiza, de 12 anos. Gabriele saiu de um relacionamento que durou mais de 18 anos, mas que começou a desandar com o nascimento da filha e a ausência do pai para determinadas tarefas.
“Parece que o pai entende que o papel dele é apenas estar presente superficialmente, mas não, a criação exige toda uma participação por parte de ambos os pais”, diz ela. A estudante de psicanálise ressalta a importância de um interesse por parte do pai, já que apenas a partir disso é possível criar-se um vínculo verdadeiro. “Por muito tempo, me culpei pela relação frágil entre meu ex-marido e a minha filha, mas hoje entendo que não cabe a mim fortalecer esta relação, e sim a ele”, pontua
Para Bruna, o papel do pai na criação de um filho é determinado histórica e culturalmente, já que desde sempre as mulheres foram orientadas a cuidar dos afazeres de casa e dos filhos, enquanto o pai saía para trabalhar. Em relação ao futuro, Bruna alimenta uma visão otimista, pois diz perceber que, ao mesmo tempo em que as mulheres têm conquistado o seu espaço no mundo do trabalho, os homens também estão sendo mais educados a cuidar do universo doméstico e dos filhos.
“Eu estou fazendo a minha parte. Dei até um boneco de bebê para o meu filho brincar, para que ele possa entender que também é papel dos homens realizar estes cuidados”, diz Bruna.
Enquanto a aguardada mudança não ocorre, para Egle, cabe ao pai que se torne mais participativo na criação do filho, mas sempre levando em consideração o espaço da mãe. “A presença dos pais é necessária, desde que nos respeitem como mães e mulheres”.
Orientação: Prof. Carlos A. Zanotti
Edição: Melyssa Kell
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