Ciência
Medida proíbe o uso de animais em produtos que já tenham a sua eficácia comprovada
Por: Allane Moraes
A decisão do Concea (Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal) de restringir o uso de animais para o desenvolvimento de cosméticos, produtos de higiene pessoal e perfumes foi bem recebida por pesquisadores ouvidos pela reportagem do Digitais.
A medida, que tem vigência imediata, proíbe uso de animais vertebrados nos testes de componentes que já tenham a segurança e eficácia comprovadas. Caso os ingredientes do produto não tenham sido testados ainda, as desenvolvedoras precisam adotar métodos alternativos reconhecidos pelo órgão integrante do Ministério da Ciência e Tecnologia para fazerem esses testes.
Róber Bachinski, mestre em Ciências com ênfase em Toxicologia Ambiental e primeiro pesquisador brasileiro a receber o prêmio internacional Lush Prize, iniciativa que apoia ações para acabar ou substituir o uso de animais em testes toxicológicos, diz que os principais testes alternativos são o teste in vitro (experimentos feitos com micro-organismos, células ou moléculas em tubos de ensaio, placas de Petri ou frascos), o teste in sílico (simulações computacionais que modelam um processo natural ou de laboratório) e a revisão sistemática da literatura. Segundo ele, nenhum desses testes, e nem o teste em animais, são totalmente eficazes.
O especialista explica que os testes tentam mimetizar o comportamento da espécie humana, mas isso não garante a eficácia e segurança de um produto. “Cada ser humano tem uma genética própria. Então, um produto utilizado por alguém vai ter um efeito diferente em uma outra pessoa”, concluiu.
Para Bachinski, os testes alternativos não são totalmente eficazes, mas os testes em animais são menos ainda, porque os animais possuem uma fisiologia diferente da humana. Ele acha que os testes dos componentes só seriam eficazes se fossem feitos para cada genética específica, através da coleta de uma amostra celular de cada pessoa.
Thales Tréz, mestre em Ética Aplicada e autor do livro “Instrumento animal: o uso prejudicial de animais no ensino superior”, acredita que a questão da eficácia não é o fator que manteve o uso de testes em animais até agora. Para ele, a prática persistiu por meio da tradição, mas o cenário já estava mudando antes mesmo da proibição do Concea. “Hoje muitas empresas têm abandonado os testes em animais não por uma questão ética e sim por questões econômicas, dada a eficiência dos testes alternativos e a rapidez que eles trazem como vantagem”, afirmou.
Apesar de a motivação para essa mudança não ser a ética, existem muitos prejuízos para os animais em que os produtos são testados. Eles vivem um regime com muitas restrições de confinamento, são manipulados de maneira agressiva e passam por muito estresse. Os procedimentos que usam esses animais, como coelhos e ratos, envolvem intervenções invasivas, cortando o animal, fazendo extração de tecidos, e injetando químicos que podem causar queimaduras e até cegá-los. Muitos desses procedimentos podem até resultar na morte desses seres vivos.
Mesmo assim, os testes em animais ainda são permitidos para o desenvolvimento de medicamentos e vacinas. Para Tréz, existe uma questão cultural da ciência, que ainda é resistente às novas possibilidades no desenvolvimento de vacinas e medicamentos. “Falta um debate mais ampliado e políticas públicas com investimento nessas pesquisas”, disse. Já Bachinski acredita que a questão é mais complexa que os testes para cosméticos, posto que medicamentos e vacinas estão diretamente ligados à saúde pública.
Edição e orientação: Prof. Artur Araujo
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