Destaque
Para Carla Rodrigues, é primordial criticar o conceito de humano, historicamente restrito ao sujeito homem
Por: Melyssa Kell
A filósofa Carla Rodrigues, também jornalista e escritora, retoma em suas pesquisas o conceito do sujeito universal abstrato, referenciado historicamente como a definição do humano por meio do sujeito homem, o que, assim sendo, relega a mulher ao papel secundário na esfera pública e privada.
“O que proponho em minhas pesquisas é retomar a ruptura já apresentada por Simone de Beauvoir sobre a diferença binária dos humanos entre homens e mulheres”, afirmou a pesquisadora em conferência para o Café Filosófico, programa gravado no auditório da CPFL em Campinas, na quinta-feira (10).
Para sustentar suas pesquisas, Carla Rodrigues, professora de Ética na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), recorreu à publicação “O Segundo Sexo” (1949), de Beauvoir, e ao também filósofo Paul Preciado, estudioso transsexual que realiza seu discurso manifesto em “Eu Sou o Monstro que Vos Fala”, na Escola da Causa Freudiana em Paris, em 2019.
Em sua análise, Rodrigues também perpassa a produção da filósofa Judith Butler, em Problemas de Gênero (1990), pensando um conceito de feminismo de forma mais abrangente. A jornalista recupera a discussão em torno da denominação de Beauvoir, pensadora pejorativamente relegada à condição de “a mulher do Sartre”, referência que lhe retirava a condição de filósofa. É um exemplo claro – diz Rodrigues – de um universo que aponta a mulher como um sujeito sempre definido em relação ao homem.
“O segundo sexo, termo que também dá nome ao livro [de Beauvoir], é sempre relegado a uma posição secundária em relação ao primeiro, o homem, e [a obra] critica de forma inaugural o humanismo, entendido como uma forma de definir o mundo a partir do homem, europeu e branco”, diz a filósofa.
Ao estudar Simone de Beauvoir, a escritora diz ser atravessada também pelas próprias experiências pessoais ao recordar que, ainda muito jovem, ouvia que não poderia realizar determinadas atividades exclusivamente por ser “menina”. Para a palestrante, já não é possível pensar no conceito de humano, uma vez que essencialmente refere-se apenas aos homens e que, ao ocupar lugares subalternos, as mulheres precisam, sobretudo, lutar pela existência conceitual.
Em Paul Preciado, a pesquisadora realça a tarefa de filósofos, ativistas e artistas de desestruturar as noções básicas de construções políticas sobre os corpos, visibilizando o debate sobre gênero. “Sexos, assim como a raça, são características sociais que se fundamentam a partir de características físicas. E a partir daí se naturalizam”, avalia a filósofa.
Pensando nesses conceitos de gênero, Carla Rodrigues chega à filósofa estadunidense Judith Butler, que questiona o feminismo feito em nome apenas do sujeito mulher. O paradoxo levantado acerca da questão é o de que, para levantar a bandeira feminista, o indivíduo precisa primeiramente reconhecer-se como mulher, o que novamente, é excludente, tal qual o conceito universal de humano.
O objetivo primordial de seu trabalho, segundo Carla Rodrigues, é ampliar o feminismo criticando a heteronormatividade. “O que me trazem esses autores é que o conceito de feminismo não pode restringir-se ao conceito universal de humano, porque ninguém pensa na mulher enquanto sujeito humano. A mulher é pensada apenas como uma mercadoria de troca, um mero objeto”, afirma a escritora.
Na conferência que gravou em Campinas, a filósofa explicou também a simbologia de um lenço que trazia amarrado ao braço, fazendo referência ao movimento feminista denominado “Ni Una Menos”, nascido na Argentina e espalhado pelo mundo.
“O Nenhuma a Menos’ é uma reivindicação de liberdade sobre nossos próprios corpos e, sobretudo, liberdade para que as mulheres possam tomar decisões morais. “Desde Simone Beauvoir existe a percepção de que nós não somos consideradas sujeitos morais na sociedade, e por isso precisamos ser tuteladas, o que está para além do absurdo”, observou.
Aqui, acesso à íntegra da conferência de Carla Rodrigues.
Orientação: Prof. Carlos A. Zanotti
Edição: Melyssa Kell
Veja mais matéria sobre Destaque
Provão Paulista incentiva estudantes da rede pública
Desde 2023, a prova seriada se tornou porta de entrada para as melhores universidades do Estado de São Paulo
Sistema de Educação ainda requer ajustes para incluir alunos PcD na educação física
Apesar dos avanços na educação, alguns profissionais ainda se sentem despreparados para lidar com esse público nas aulas
Revolução na luta contra Alzheimer: Unicamp lidera avanços com IA na inovação farmacêutica
Pesquisas inovadoras unem tecnologia e biociência na busca de tratamentos eficazes para doença neurodegenerativa
Projeto social promove atividades pedagógicas em escolas de Campinas
São pelo menos 280 jovens mobilizados nos encontros e quatro escolas que abraçam as atividades propostas
Valinhos é eleita a cidade mais segura do Brasil em 2024
Uso de tecnologia e aumento de 30% no efetivo da Guarda Civil Municipal aumentam a segurança e a qualidade de vida na cidade
Novembro Azul destaca o papel da hereditariedade no avanço do câncer de próstata
Especialista explica como o fator genético pode acelerar o câncer masculino