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Agricultor Eduardo de Souza avalia que os consumidores devem continuar pagando mais caro nos alimentos
Por: Alessandra de Souza
O Estado de São Paulo enfrentou um longo período de estiagem no outono, considerado por especialistas como o mais seco dos últimos anos. Para complicar a situação dos agricultores, a quantidade de chuva da primavera, que se encerra no próximo dia 21 de dezembro, não tem sido suficiente para a agricultura. A avaliação é do produtor de alimentos orgânicos Eduardo de Souza, de Jaguariúna, que desde 1993 planta e vende hortaliças, legumes e frutas em feiras livres de produtos orgânicos de Campinas. Membro da Associação de Agricultura Natural de Campinas e Região (ANC), ele teme pela escassez de chuvas na região, que vai impactar diretamente no valor dos alimentos para o consumidor final.
Há quanto tempo você trabalha no ramo de produtos orgânicos?
Há aproximadamente 27 anos. Comecei a trabalhar indiretamente em outra propriedade e depois voltei para o sítio de meus pais, onde trabalho há mais de 15 anos com a agricultura orgânica. No início a gente produzia seis tipos de hortaliças e hoje produzimos em torno de 55 produtos variados, entre frutas, legumes e verduras. No começo de tudo éramos eu, meu irmão e meu pai. Hoje trabalhamos em oito pessoas.
Estamos vivendo dias de altas temperaturas e temporais. Qual é a sua expectativa para a produção dos próximos meses com a chegada do verão?
Na região que temos plantação, em Jaguariúna, choveu muito pouco nas últimas semanas e por isso tivemos que diminuir a área plantada. Temos expectativa que a chuva retome por conta da previsão dos próximos dias e que volte à normalidade o mais rápido possível. Já era para estar chovendo, porque estamos em dezembro.
A instabilidade do clima afeta a produção? Você teve prejuízos no último outono, que foi muito seco?
Acredito que o maior prejuízo seja a diminuição da área plantada, que interfere na quantidade de produção necessária. Não tivemos muita chuva em Jaguariúna e sim mais calor. O maior cuidado para o produtor é irrigar a horta mais vezes no dia, para controlar a temperatura e não ter uma perda maior.
Como o período de estiagem afeta a lavoura?
No meu caso, diminui em torno de 60% da área de produção por conta da falta de água. Acredito que enquanto não chegar a chuva não teremos nenhuma melhora na produção. Por enquanto, estou conseguindo pegar água de um vizinho próximo, há 420 metros da propriedade. Tenho uma bomba, que joga a água no meu reservatório para depois fazer a irrigação da horta. É um custo alto, que acaba sendo diluído no preço final do produto. No ano passado choveu em outubro, novembro, dezembro, janeiro e fevereiro. Foram chuvas abaixo da média. Em março passado, que teoricamente seria para ter as últimas chuvas, não choveu. Por isso faltou água muito cedo e isso é uma consequência de anos. As chuvas estão diminuindo.
De que maneira o consumidor final é atingido com o calor, a seca e as chuvas torrenciais?
Além de ser afetado pela alta dos preços, consequentemente terá a falta de produtos. Quando chove além do esperado, tem uma chance maior de perder os produtos plantados. Por exemplo, as hortaliças podem ter as folhas queimadas ou elas apodrecem por dentro. Na agricultura orgânica os alimentos são plantados de acordo com a época. Os que são cultivados no outono e primavera – e até mesmo no verão – serão consumidos somente no próximo ano. Nós que trabalhamos com o setor orgânico não plantamos alimentos fora da época, porque o risco de perda é muito grande.
Após cinco anos da última crise hídrica, vivemos um longo período de estiagem. Esse prazo, entre uma seca e outra, é preocupante para a agricultura?
Sim. Vivemos há mais de dez anos uma diminuição no volume de chuvas. Acredito que a crise atual está pior do que a de 2014. Em outubro daquele ano foram registrados 96 mm de chuva em Campinas e este ano tivemos 39 mm. É uma situação difícil a dos agricultores, que nem sempre têm reservatório. Às vezes, eles têm só um rio que passa próximo a sua plantação. Na agricultura convencional de larga escala, como milho, soja, trigo, laranja e café, os produtores dependem só da chuva. Já a produção de hortifrúti tem que ser irrigada se você quiser produção constante, o que é pior.
Na sua opinião, por que o mercado de produtos orgânicos expandiu nos últimos anos em Campinas e RMC?
Especialmente pela qualidade do produto, além, é claro, da questão da saúde e uma certa economia, porque consumindo alimentos orgânicos você evita possíveis problemas de saúde. Os consumidores têm investido muito. De 10 anos para cá, o número de clientes cresceu em torno de 70% a 80% e esse número aumenta ano a ano.
A agricultura familiar é a principal responsável pela produção de alimentos no país. O governo federal oferece algum suporte a esses agricultores?
A agricultura familiar produz 60% dos alimentos consumidos pelo país. No meu caso, eu tive suporte da agricultura familiar e foi fundamental para eu alavancar a minha produção e comercialização. O PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar, financiado pelo governo federal) possibilita o financiamento, mas é preciso ter uma garantia de pagamento e muitos produtores não conseguem. Não acredito que vamos ver tão cedo no Brasil, por exemplo, o governo pagando subsídio de 50% ou 60% de uma produção que foi perdida. Falta muito para os governantes enxergarem que a agricultura é o que mantém o país em pé. Tem essa diferença de ponto de vista entre o grande, médio e pequeno produtor, principalmente com relação à isenção de taxas e impostos. Os grandes produtores podem negociar. Eu, como pequeno produtor, não posso.
Orientação: Profa. Cecília Toledo
Edição: Danielle Xavier
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