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A outra face da Reciclagem: catadores e suas lutas diárias

Por: Júlia Garcia

No Brasil, os catadores de materiais recicláveis desempenham um papel essencial na reciclagem e redução de resíduos urbanos. Embora contribuam diretamente para a sustentabilidade e economia nas cidades, a rotina desse profissional ​​envolve desafios diários, principalmente para quem trabalha de forma autônoma se deparando com condições trabalhistas precárias. Segundo pesquisa feita pela Ciclosoft em 2023, 70% dos catadores autônomos possuem uma renda mensal abaixo de R$1.100 e 67,7% deles não recebem qualquer benefício do governo.

Vitor Meireles já atuou como catador de materiais recicláveis de forma autônoma e dentro de cooperativas por quase 10 anos, hoje ele é o atual presidente da Cooperativa de Reciclagem São Bernardo, em Campinas. Em sua trajetória como independente, enfrentou diversos desafios físicos, emocionais e econômicos. “Era muito esforço físico, tinha também a falta de material”, lembra. Ao buscar melhores condições, Vitor viu na cooperativa uma oportunidade. “Eu entrei porque sabia que ia aprender mais coisas, ia ter uma renda melhor também, porque na rua a gente sai meio sem saber quanto a gente vai conseguir tirar no dia”, conta o profissional.  

A Socióloga e Educadora Ambiental, Elaine Ricci explica que a formalização dos catadores possibilita uma melhora na qualidade de vida, através dos benefícios nas condições de trabalho e o incentivo no meio empresarial, “Eu entendo que a formalização dos catadores e catadoras traz mais dignidade para o trabalho, porque assim, eles conseguem trabalhar em condições mais adequado, buscar parcerias que fortaleçam esse ambiente e fazer esse trabalho da melhor forma”, explica Elaine. 

Em Campinas, de acordo com os dados deste ano do Novo CAGED, a remuneração desse profissional pode variar entre R$1.596,61 e R$2.350,18, dependendo da política da empresa. Renata, embaixadora do Lixo Zero de Campinas, ressalta que, apesar de alguns benefícios que as cooperativas oferecem, os catadores ainda não recebem o reconhecimento social que merecem: “É um trabalho de suma importância social, tanto na reciclagem do resíduo sólido como na compostagem. Mas, ainda nós não chegamos a uma consistência de olhar para essas pessoas como agentes sociais e ambientais que estão cuidando do nosso futuro “, avalia. 

Valdecir Viana, proprietário da rede de cooperativas de Campinas, Reciclamp, destaca o importante papel das cooperativas na inclusão e reabilitação social desse trabalhador. “Geralmente são pessoas que estão excluídas do mercado tradicional de trabalho por não atenderem de alguma forma. E aqui nos colocamos à disposição para receber as pessoas com os mesmos direitos e deveres”, explica o proprietário. Na Reciclamp, os catadores passam por treinamentos teóricos e práticos, desenvolvendo o conhecimento sobre as atividades e seus direitos. Além disso, a rede possui cerca de 150 cooperados (as), recicla aproximadamente 600 toneladas por mês e a renda média para os catadores, sem estar amparada pelo INSS, é de R$2.400 mensal. 

A Rede de Cooperativas Reciclamp possui 150 colaboradores, 15% atuam na área administrativa ou na coordenação e todos são considerados catadores/catadoras. (Foto: Júlia Garcia)

Fátima Aparecida Lopes da Silva é catadora há 7 anos na Cooperativa Projeto Reciclar, instituição que faz parte da Rede Reciclamp. Sua trajetória começou após ficar desempregada na pandemia, quando uma amiga a incentivou a deixar seu currículo em uma cooperativa, “Não conhecia, mas deixei o currículo e em uma semana me chamaram. Graças a Deus”, comemora. Foi a partir disso que Fátima conseguiu uma nova chance de atuar ativamente no mercado de trabalho. “Eu agradeço a Deus por ter esse trabalho. É daqui que eu levo o meu sustento. É um serviço honesto, serviço digno, paga certinho, não tem problema nenhum aqui. Então, eu tenho orgulho de falar, eu cato o lixo, eu separo o lixo”, exalta a profissional. 

Segundo o Ciclosoft em 2023, 86,3% dos catadores de materiais recicláveis pretendem continuar no ramo da reciclagem, mas a grande maioria não se vê trabalhando em cooperativas ou associações. De acordo com a pesquisa, 38% dos catadores autônomos não se interessam em fazer parte do trabalho formal, dentre eles 12% alegam que a renda seria maior na catação autônoma, entretanto 36% dizem não saber como fazer parte de uma cooperativa ou não possuem conhecimento da localização das associações da sua cidade.

A formalização desse ramo, embora seja para oferecer maior qualidade de trabalho ao catador, permite também o acesso para as cooperativas e associações a subsídios, programas de capacitação e políticas públicas voltadas ao setor, “Quando a gente olha para gestão, a gente tem que entender que essa pessoa se torna um agente ambiental e porque é importante eles estarem formalizados? Porque a gestão de resíduos é um problema de política pública e para que a Prefeitura consiga, de alguma forma, ajudar esse setor a se desenvolver, precisa de uma formalização”, explica Luiza Corradini, engenheira ambiental e  que faz parte da Associação Brasileira de Compostagem. 

Embora ainda seja uma questão pouco explorada, a formalização desse profissional é crucial para o desenvolvimento de um sistema de gestão de resíduos justo e eficiente, que valorize tanto os trabalhadores como o meio ambiente. Dessa maneira, reconhecer  esse profissional como um agente social ou ambiental abrange questões de dignidade e segurança, mas também contribui para um futuro mais sustentável e consciente. 

Orientação: Profa. Karla Ehrenberg

Edição: Mariana Dadamo


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