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Imprensa reforça estereótipos sobre idosos, alertam especialistas

Mídia pode contruir preconceitos sobre a terceira idade, principalmente por abordarem normalmente apenas violência e saúde

Por Dan Whitaker, Julia Briza, Lara Nave, Maria Clara Bigotti Bastos e Maria Fernanda Ferreira Masetti

A imprensa brasileira tem reforçado estereótipos de fragilidade e dependência ao retratar os idosos, o que afeta negativamente a percepção pública e a autoestima dessa população, alerta o jornalista José Pedro Martins, especialista em gerontologia e professor. Com o envelhecimento acelerado da população – estima-se que mais de 25% dos brasileiros terão mais de 60 anos até 2040 –, a cobertura jornalística sobre a terceira idade ainda se concentra em crises, como a violência contra os idosos, e negligencia aspectos positivos do envelhecimento ativo.

Para o jornalista José Pedro Martins, também especialista gerontologia, a mídia pode reforçar ou quebrar os esteriótipos associados aos idosos (Foto: Arquivo Pessoal)

“A forma como os idosos são retratados influencia não só a percepção pública, mas também a forma como eles mesmos se veem”, afirmou Martins. Ele ressalta que a mídia tem o poder de reforçar ou quebrar estigmas, mas muitos estereótipos negativos ainda são perpetuados. Para ele, o envelhecimento da população é uma transformação social profunda e inescapável, mas ainda subvalorizada nos veículos de comunicação brasileiros. O desafio, segundo o especialista, está na readequação dessa pauta às novas realidades, sem reforçar imagens que desqualificam o idoso.

De acordo com um levantamento realizado pelo projeto Idosomídia da Unesp, a imprensa brasileira dá pouca visibilidade ao idoso como protagonista social. O estudo aponta que a cobertura atual é episódica, limitando-se a situações pontuais ou escândalos relacionados a políticas públicas. Esse viés reforça a imagem de idosos como indivíduos passivos, sem considerar sua crescente participação nas esferas sociais e tecnológicas, algo já comum em muitos países de Primeiro Mundo.

Segundo Ana Holanda, psicóloga especializada em envelhecimento e direitos humanos, as reportagens sobre a terceira idade, quando existem, geralmente focam em problemas como a violência e a saúde precária. “O idoso raramente é visto como protagonista”, declarou a psicóloga, ressaltando a falta de cobertura que destaque as conquistas e potencialidades dos mais velhos. Nos Estados Unidos, por exemplo, já existem canais de TV dedicados à terceira idade, como a Retirement Living TV, que oferecem uma programação voltada exclusivamente ao público idoso, mostrando-o em uma luz mais positiva e ativa.

Martins também ressalta os perigos da desinformação. “Já vi reportagens promovendo terapias sem embasamento científico, que prometem milagres contra o envelhecimento. Isso é um desserviço à sociedade. A mídia precisa ser mais responsável ao lidar com esses temas”, acrescentou o jornalista.

José Alberto Macedo Nogueira, membro do Conselho Municipal da Pessoa Idosa de (CMI) Campinas, destaca que a mídia também falha ao não abordar as demandas cotidianas dos idosos, como acessibilidade, lazer e integração social. “A mídia foca em abusos e violência, mas pouco explora as necessidades reais da terceira idade”, criticou. Nogueira ressaltou que uma cobertura mais inclusiva ajudaria a pressionar por políticas públicas voltadas a essa crescente parcela da população. Ele cita como exemplo a falta de atenção da imprensa para temas como a adequação do transporte público para idosos ou a implementação de tecnologias acessíveis para facilitar o cotidiano do público 60+.

“A mídia foca em abusos e violência, mas pouco explora as necessidades reais da terceira idade”, critica José Alberto Macedo Nogueira, membro do Conselho Municipal da Pessoa Idosa de Campinas (CMI). (Foto: Artur Araujo – Prefeitura de Campinas)

O conselheiro do CMI também ressaltou que a imprensa pode ser uma importante aliada na divulgação dos direitos dos idosos e na luta contra a violência. “A violência contra o idoso é um problema grave e crescente no Brasil. A imprensa precisa ser mais enfática ao tratar desse tema, porque é através da informação que podemos sensibilizar a sociedade e pressionar por mais políticas públicas que combatam esses abusos”, acrescentou.

Ignorar o crescimento do público 60+, de acordo com os especialistas, seria negligenciar uma das transformações sociais mais significativas do século. O aumento da expectativa de vida e da participação ativa dos idosos na sociedade demanda uma revisão na forma como essa população é retratada na mídia.

Aposentadoria e saúde

Segundo Ana Holanda, a imprensa tem dado espaço para questões relacionadas aos direitos dos idosos, como aposentadoria e acesso à saúde. No entanto, essas pautas, em muitos casos, são tratadas mais como parte de crises políticas ou econômicas do que como questões de justiça social. Holanda acredita que há um descompasso entre o volume de matérias sobre a terceira idade e a profundidade dessas reportagens. “Falamos sobre aposentadoria em momentos de crise, mas pouco abordamos as conquistas diárias e os direitos que estão sendo violados de forma silenciosa. O idoso raramente é visto como protagonista”, afirma a psicóloga.

Nesse sentido, o estudo da Unesp observa que, além de cobrir crises, como os escândalos previdenciários ou a violência, há uma ausência de uma cobertura regular e sistemática que mostre os idosos como agentes ativos, participando de atividades políticas, culturais e tecnológicas. Na Europa, há uma tendência crescente em considerar o idoso como um protagonista social, não massificado em um único grupo, mas reconhecido em sua diversidade, com interesses que vão além da saúde e aposentadoria, envolvendo lazer, formação intelectual e até a participação política.

Para José Pedro Martins, um dos principais desafios enfrentados pela terceira idade que não recebe a devida atenção da mídia é o envelhecimento saudável. “Falamos muito sobre doenças, mas pouco sobre prevenção e envelhecimento ativo. A imprensa precisa educar o público sobre como o envelhecimento pode ser uma fase positiva, cheia de realizações”, afirmou.

José Pedro Martins e Ana Holanda sugerem que o papel da imprensa precisa ir além da denúncia de crises e desafios, incluindo um olhar mais amplo e positivo sobre o envelhecimento. Para ambos, é fundamental que a mídia mostre histórias de sucesso, inovações e o protagonismo social dos idosos, proporcionando uma imagem mais realista e inclusiva. Dessa forma, a imprensa ajudaria a combater preconceitos e estimularia políticas públicas que considerem os idosos como uma parte essencial e ativa da sociedade.

Foto de capa: Pixabay

Orientação: Prof. Artur Araujo

Edição: Mariana Neves


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