Destaque

Universidades investem na construção da diversidade

Ações diversas são realizadas na Unicamp e PUC-Campinas para fortalecer a inclusão

Por: Taís Regina e Gabriela Moda

As duas maiores universidades de Campinas, a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e a Pontifícia Universidade Católica de Campinas, estão inovando em direção à inclusão e diversidade em seus espaços. Por meio de calouradas negras, grupos de estudos e rodas de conversa, estão promovendo experiências distintas. Estas iniciativas estão ocorrendo atualmente nos campus das universidades, envolvendo tanto membros da comunidade acadêmica quanto novos ingressantes. O objetivo é criar ambientes mais inclusivos e diversos, reconhecendo a importância da representatividade e do diálogo para uma educação mais abrangente e igualitária.

O Núcleo de Consciência Negra (NCN) da Unicamp nasceu em 2011 com objetivo de refletir sobre as cotas raciais na universidade. A universidade estadual campineira foi uma das últimas a aderir o sistema de reservas de vagas para pessoas negras, pardas, indígenas e pessoas com necessidades especiais. E a essência dos estudantes do núcleo foi se juntar, aglomerar e pautar a negritude na faculdade. “O núcleo de consciência negra surge com essa missão, aquilombar esses alunos negros que eram vistos de formas separadas, tinha um bolinho ali e aqui, mas não tinha nada que organizasse esses alunos na universidade”, explica Isabella Aparecida da Silva de 22 anos, uma das representantes do NCN e estudante de ciências sociais na Unicamp.

Valdineia Bueno e Edna Lourenço são coordenadoras do CEEAB na PUC-Campinas (Foto: Taís Regina)

O papel dos Núcleos de Consciência Negra em universidades vai além de simplesmente oferecer um ambiente para os estudantes negros, pardos, indígenas e PCD se reunirem. Eles atuam como um centro de resistência e celebração da cultura afro, fornecendo um local onde a arte, a história e todas as outras manifestações culturais afrodescendentes são reconhecidas, respeitadas e valorizadas. É importante ressaltar que os núcleos não se limitam apenas a servir como um acolhimento para os estudantes, mas também como uma ponte entre diferentes pessoas nas faculdades. A realização desses eventos, palestras, debates e programas que abordam conteúdos relacionados à história e à vivência negra, o Núcleo convida toda a comunidade interna e externa da faculdade a se envolver em conversas significativas sobre inclusão, mazelas sociais e diversidade.

As principais atividades promovidas pelo NCN na Unicamp são as reuniões semanais abertas ao público, para pessoas negras e não negras, para discutirem referências, pensadores, bibliografias, música e temas diversos voltados à cultura negra. Durante o ano, promovem também a Calourada Negra, evento para calouros universitários onde trazem convidados de diversas esferas para falar sobre a negritude em variados contextos. No início deste ano, os rappers Dexter, Tracie, e o integrante do grupo Racionais MC ‘s Ice Blue, usaram suas experiências para conversar com os novos alunos da universidade na calourada negra.

As universidades são espaços de conhecimento e transformação social, através delas é gerado estudantes engajados com comunidades, formação acadêmica, e geram promoção da inclusão e diversidade, oferecendo oportunidades educacionais para estudantes de diversas origens socioeconômicas, étnicas, raciais, de gênero e culturais. É dever delas criarem ambientes onde a diversidade é valorizada e celebrada, e onde as diferenças são reconhecidas como uma fonte de enriquecimento para a comunidade acadêmica. A troca de vivências e experiência da pluralidade de alunos, auxiliam em um futuro com mais equidade nas futuras carreiras, empresas, comunidades e a sociedade em geral.

Inauguração do centro de estudos Africanos e Afro-Brasileiros contou com presença de autoridades religiosas e políticas (Foto: Assessoria da PUC-Campinas)

Apesar de ser esse o papel das universidades, no dia a dia de estudantes não brancos é permeado pelo racismo estrutural. Os sinais do racismo epistêmico aparecem não apenas nas limitações ao acesso de negras e negros nas universidades, mas também quando o conhecimento produzido por eles é desconsiderado. O estudante negro que está na universidade como docente vê ao seu redor e identifica todas as limitações que o racismo impõe ao ensino e ao universo da pesquisa. Por este motivo, estudantes têm se movimentado para criações de espaços onde mazelas sociais e raciais possam ser discutidas e eliminadas.

Inovação em centro de estudos da PUC-Campinas

Na PUC-Campinas, o Centro de Estudos Africanos e Afro-Brasileiros Dra. Nicéa Quintino Amauro foi inaugurado em agosto de 2023 fruto de um trabalho coletivo, resultado das demandas do movimento negro da cidade Campinas e da comunidade interna da universidade. Foram diversos trabalhos sobre a temática racial até a inauguração do CEAAB, e hoje, Valdineia Bueno de 62 anos, coordenadora do espaço, relata que o centro está mudando a cultura institucional, pois além das atividades e palestras, eles possuem grupos de estudos, propostas de debates com filmes e documentários e propostas de curso de extensão pelos membros da comunidade negra de Campinas e região.

Palestra na semana da calourada 2024 organizada pelo núcleo de consciência negra da Unicamp (Foto: Soul Okê Facho)

Os representantes do NCN na Unicamp e do CEAAB na PUC-Campinas relata enfrentarem desafios constantes nas ações para a comunidade negra universitária. O racismo estrutural que permeia as vidas de pessoas negras, a ignorância de alguns membros universitários de tentarem barrar as ações dos núcleos e a falta de investimentos. “Para fazer essa calourada de 2024, a gente tinha 100 reais no bolso e seis militantes”, diz Isabella Aparecida. Ela relata também que muitos dos problemas enfrentados seriam facilmente evitados com o apoio institucional. “Apesar do sistema de cotas, a nossa presença na universidade ainda é muito hostilizada”, diz a representante do NCN.

Apesar das dificuldades, a existência e o fortalecimento dos núcleos e centros de consciência negra enriquecem a experiência universitária para os estudantes negros, além de ter um impacto significativo na sociedade em geral. A capacitação os estudantes negros a se tornarem líderes, pensadores críticos e agentes de mudança, o Núcleo contribui para a construção de um futuro mais diversos, democrático e equitativo para todos.

Laura Silva é estudante de pedagogia na Unicamp e diz que o NCN ajudou a criar afeto e memórias na universidade que levará para toda vida (Foto: Laura Silva)

A estudante de pedagogia da Unicamp, Laura Silva, de 20 anos, diz ser importante ter um espaço para os estudantes negros para que eles se sintam pertencentes na universidade, para que elas possam se ajudar, aprender sobre suas origens e compartilhar vivências. Ela considera muito importante a Calourada feita no início da vida universitária na Unicamp porque é uma dedicação muito grande do NCN de trazer palestras com convidados especiais, rodas de conversas toda semana para discutir de que forma o racismo afeta a vida desses alunos, e como a cultura periférica ainda é marginalizada na universidade. Laura diz se sentir mais preparada com o racismo na faculdade justamente por ter um espaço interno onde é pautado as questões raciais.

A importância desses espaços universitários auxilia em outros aspectos na vida dos estudantes negros. O racismo na universidade pode ter um impacto profundo na autoestima desses alunos, afetando não apenas seu bem-estar emocional, mas também seu desempenho acadêmico e seu senso de pertencimento. “A identidade é afetada por causa disso porque nós começamos a nos reconhecer mais não só como indivíduo, mas como um povo, cidadão qual é o nosso papel e a nossa autoestima está super ligada nisso, porque não é só a parte estética, mas só a estética já muda completamente porque estamos cercados de pessoas parecidas conosco e isso me faz sentir mais forte e bonita e muda completamente tudo” relata Laura Silva.

A criação de núcleos e centros de consciência racial foi e é fundamental para que mudanças sejam fomentadas e novas narrativas sejam construídas sem marginalização, discriminação, preconceito e racismo nas universidades brasileiras. O objetivo do NCN e do CEAAB é movimentos de confluência para a sociedade, comunidade e ocupar as universidades com corpos e rostos pretos, indígenas e pardos. “A gente quer que as universidades tenham essa cara, esse corpo e questionem 100% do tempo qual o tipo de universidade que a gente quer, qual a cara desse povo e qual é a cara desse povo brasileiro. A gente está pensando em qual tipo de universidade que a gente quer. A gente não quer mudar o prédio universitário, a gente quer mudar a estrutura dela” finaliza Isabella Aparecida.

Orientação: Prof. Gilberto Roldão

Edição: Giovanna Sottero


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