Ciência

Especialista vê o carro elétrico na contramão da economia verde

Baterias à base de lítio provocam grande devastação natural, afirma professor da Unicamp

Por: Enzo de Castro Urnhani e Lucca Panzarini Marson

Professor afirma que a bateria disponível no mercado demanda uma grande devastação natura (Crédito: Arquivo Pessoal/Professor do Laboratório de Genômica da Unicamp, Gonçalo Amarante)

O potencial dos carros elétricos tem sido apontado como um caminho verde para a superação da economia à base de carbono. Mas para o professor Gonçalo Amarante, do Laboratório de Genômica da Unicamp, essa alternativa não é tão boa quanto parece. “O melhor tipo de bateria disponível no mercado, a bateria de lítio, demanda uma grande devastação natural,” alertou o professor. O especialista vê no biocombustível a melhor resposta aos desafios das mudanças climáticas.

O carro elétrico não emite CO2, mas a extração do lítio está associada a diversos impactos ambientais. A mineração a céu aberto, por exemplo, envolve a remoção de grandes quantidades de solo e rochas, podendo levar à destruição de habitats naturais e à alteração significativa da paisagem. O processo de mineração consome também grandes volumes de água, impactando os recursos hídricos locais. A extração de lítio também pode liberar substâncias tóxicas, como metais pesados, que podem contaminar o solo e os cursos d’água.

Para o professor, a melhor opção para buscar uma alternativa eficaz para o meio ambiente e eficiente no ponto de vista financeiro é o biocombustível, tecnologia que vem sendo desenvolvida com sucesso nos últimos anos e que pode ser produzida em grande escala no Brasil. “Esse motor [de biocombustível] alimenta uma pequena bateria que vai movimentar o motor elétrico. Esse é o melhor dos mundos e a tecnologia está avançando nessa direção”, explicou Amarante.

O professor da Unicamp diz que precisamos parar de emitir CO2 fóssil para a atmosfera, elemento que é gerado a partir da queima de combustíveis como gasolina e diesel. Já o CO2 de origem biogênica, ou seja, desenvolvido como biocombustível, é capaz de gerar uma economia circular. Ele ainda cita os benefícios econômicos disso, considerando a maior geração de emprego que esse processo traria, desde o campo até a indústria.

Aproveitamento energético

O ponto positivo para a aquisição de carros elétricos é seu maior aproveitamento energético em relação ao carro movido à combustão. O mercado nacional de carros elétricos e híbridos atingiu seu pico histórico no início de 2024. De acordo com a Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), em abril, 15.206 veículos foram comercializados no Brasil, o que representa um aumento de 217% em relação ao mesmo período do ano passado. Nos primeiros quatro meses deste ano, cerca de 1,4 milhão de automóveis foram emplacados, representando um aumento de 20%, comparado aos quatro primeiros meses de 2023. Mas apesar de o mercado de carros elétricos estar crescendo no Brasil, alguns países que fizeram um investimento grande nos últimos anos estão vendo uma queda na procura, apesar da alta na produção. Em agosto de 2023, o Governo dos Estados Unidos havia anunciado um incentivo de US$ 12 bilhões para fábricas produzirem carros elétricos.

Porém, de acordo com um levantamento da empresa de consultoria J.D.Power, existe uma desaceleração considerável na intenção de compra dos americanos nos carros elétricos. A previsão indica um crescimento de 21% em 2024 e 19% em 2025, números que ficam abaixo dos 31% registrados em 2023 e dos 60% observados em 2022.

Outro exemplo é a Noruega. Conhecida pelos substanciais subsídios governamentais para carros elétricos, os resultados não foram os esperados. A demanda por combustíveis fósseis diminuiu apenas 4% de 2010 a 2022, apesar de 20% da frota norueguesa ser elétrica, de acordo com o relatório “A Ilusão Norueguesa” de Leigh Goehring e Adam Rozencwajg, da gestora norte-americana Goehring & Rozencwajg.

Polêmica antiga

Especialista acredita que 10% da população deve utilizar o carro elétrico (Crédito: Arquivo Pessoal/Piloto de Testes e Especialista do Setor Automotivo, César Urnhani)

Para o piloto de testes e especialista da indústria automotiva, César Urnhani, o Brasil vive hoje o que esses países viveram há 10 anos. Ele acredita que, no futuro, veremos essa mesma desaceleração, fazendo com que os carros elétricos atendam apenas 10% do mercado. “É um carro que traz benefícios, mas para uma pequena parcela da população que pode ter uma vida adaptada ao carro elétrico. Geralmente são pessoas que têm dois carros. Se a gente pegar o que está acontecendo nos Estados Unidos e na Europa, vemos que existe uma baixa demanda por veículo elétrico”, afirmou. De acordo com Urnhani, os modelos que devem cair no gosto do público são os híbridos, ou seja, um carro com motor a combustão e com motor elétrico, com o objetivo de gerar uma extensão de quilometragem para consumir menos combustível, e com isso atender questões de emissões. Ele explica que um produto brasileiro pode ajudar nessa questão da diminuição dos gases poluentes: o etanol. “Num futuro muito próximo, o motor a combustão, que está junto com o motor elétrico do híbrido, será um motor a etanol, mais amigo do meio ambiente”, acrescenta. Um dos poucos países que vem apresentando um crescimento acelerado é a China. Os híbridos e elétricos representarão 40% dos carros vendidos em 2024, prevendo vendas totais de 12 milhões de automóveis novos ao longo deste ano. Por outro lado, atualmente, a China responde por cerca de 60% do uso mundial de carvão, um dos combustíveis fósseis mais poluentes. A maior economia emergente e maior emissora do planeta está em plena recuperação dos lockdowns da Covid e aumentou suas emissões em 4%, ajudando a emissão global crescer 1,1%.

Orientação: Prof. Artur Araújo

Edição: Mariana Neves


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