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Câmara aprova projeto que altera o uso de áreas urbanas

PLC altera a lei de 2018, que permite a expansão do perímetro urbano de Campinas

Por: Marília Coimbra e João Viana

A vereadora Paolla Miguel (PT) levou cartazes e bandeiras contra o PLC 88/2023 (Foto: Marília Coimbra)

Foi aprovado na segunda-feira (10), pela Câmara Municipal de Campinas, o Projeto de Lei Complementar 88/2023, de autoria do prefeito Dário Saadi. O PLC altera a Lei nº 207 de 20 de dezembro de 2018, que permite a expansão do perímetro urbano da cidade. Agora, o projeto aprovado substitui a lei que vedava loteamentos nestas áreas e cria ainda zoneamento em beiras de rios e áreas rurais, permitindo o parcelamento, uso e ocupação do solo.

Durante o período de votação, os vereadores Paulo Bufalo (PSOL), Paolla Miguel (PT), Guida Calixto (PT) e Mariana Conti (PSOL) se manifestaram nas redes sociais chamando o público para uma mobilização contra a aprovação do projeto durante as votações do segundo turno. Segundo eles, a lei aprofunda a devastação ambiental, já que flexibiliza a construção de novos empreendimentos em áreas propícias a alagamentos, enchentes e erosão de solo.

Seguindo o chamado dos vereadores, a professora aposentada, Ernestina Gomes de Oliveira, esteve presente durante a votação e se mostrou totalmente contra a aprovação do projeto. Ernestina aponta que o principal ponto negativo dessa aprovação é a extinção do cinturão verde, formado pelas áreas rurais da cidade. “Vamos acabar encostando em todos os outros municípios, Paulínia, Indaiatuba, Valinhos, Itupeva. Isso é extremamente nocivo para a cidade, já que esse cinturão verde é o que garante qualidade de vida pra gente, especialmente em tempos de mudanças climáticas”, explicou.

A professora aposentada, Ernestina Gomes de Oliveira, aponta que o principal ponto negativo dessa aprovação é a extinção do cinturão verde (Foto: Marília Coimbra)

Ao contrário de Ernestina, a empreendedora imobiliária, Lucia Abadia, foi a favor da aprovação do projeto. A empreendedora afirmou que a proposta do projeto traz grandes melhorias para a classe trabalhadora, pois o crescimento da área urbana traz a facilidade de ter empreendimentos próximos a casa do trabalhador. “É essencial ter um comércio próximo a sua casa, uma escola, uma Unidade Básica de Saúde, uma empresa onde você possa trabalhar. A cidade tem que criar novas centralidades, e isso não é benéfico só para as pessoas daquela região, mas sim para toda Campinas”, complementou.

Marcelo Coluccini, secretário de Planejamento e Desenvolvimento Urbano de Campinas, afirmou que a urbanização dessas áreas traz melhorias para o local, já que é necessário colocar rede de esgoto tratado e a revegetação das áreas. “Existe o ganho de área verde, ganho de tratamento de esgoto, e isso eu enxergo como um ganho para o meio ambiente. Além disso, quando aumentamos a oferta de áreas urbanas, o custo delas diminui, e isso passa a fazer parte do interesse social”, argumentou.

Secretário de Desenvolvimento e Planejamento Urbano de Campinas, Marcelo Coluccini, afirmou que a urbanização dessas áreas traz melhorias para o local (Foto: Arquivo Pessoal)

O secretário também explicou que o Projeto de Lei Complementar não altera o perímetro urbano de Campinas, e que ele cria restrições ambientais para a implantação de empreendimentos nessas áreas. E que caso esses desastres ambientais venham acontecer, Campinas tem planos de combate, como o Plano Local de Ação Climática, que tem como medidas o reflorestamento de áreas, mudanças de combustíveis em ônibus que usam combustíveis fósseis e uso de placas solares em hospitais e prédios públicos.

Segundo o vereador Paulo Bufalo (PSOL), o projeto possui ilegalidades e carrega um vício de alterar outra legislação, afetando a constitucionalidade. “Ele facilita ainda mais a expansão urbana da cidade sobre áreas rurais e áreas de proteção ambiental, aumentando a degradação, já que tira a proteção sobre essas áreas”, completou.

A vereadora Mariana Conti (PSOL) afirmou que, tanto a Lei 207 de 2018, quanto o PLC 88/2023, favorecem apenas a especulação imobiliária (Foto: Reprodução/TV Câmara)

A vereadora Mariana Conti afirmou que, tanto a Lei 207 de 2018, quanto o PLC 88/2023, favorecem apenas a especulação imobiliária, e não resolvem o problema de faltas de moradias e o custo médio de aluguéis na cidade, aumentando também o custo de vida da população. “Ela permite que você faça negócios, mas não leva em conta as necessidades do conjunto de pessoas que moram em Campinas”, explicou a vereadora.

De acordo com a vereadora, o projeto possui diversos pontos problemáticos. Mariana chama a atenção para dois deles, sendo eles a permissão de verticalização a 120 metros de áreas de preservação ambiental e a flexibilização de construção de empreendimentos em áreas irregulares, pois essas áreas correm risco de alagamentos e contaminação do solo.

Wagner Romão, professor de Ciência Política da Unicamp afirma que ao invés dessas áreas se ampliarem, o ideal o ideal seria ocupar os vazios urbanos. (Foto: Reprodução/Redes Sociais)

A opinião de Wagner Romão, professor de Ciência Política da Unicamp, é a mesma dos vereadores do PSOL, Mariana Conti e Paulo Bufalo. Wagner também aponta o fato de que Campinas não tem a necessidade de uma expansão urbana, já que não há um crescimento populacional significativo como tinha antigamente. “Nós temos muitos vazios urbanos. Ao invés dessas áreas se ampliarem, o ideal era que a Prefeitura Municipal de Campinas incentivasse a população a ocupar essas áreas, para depois, se necessário, ocupar o perímetro rural”, complementou.

O professor explicou que áreas que fazem parte desse projeto e que antes eram vedadas para construção, agora serão restritas, o que possibilita a construção em áreas irregulares. Para Wagner, a ocupação dessas áreas pode colocar a saúde da população campineira em risco, pois são áreas com grande probabilidade de contaminação e propagação de doenças.

Em contrapartida, o vereador Paulo Gaspar (NOVO), que votou a favor da aprovação do projeto, disse ser contra a proposta, mas que ele se torna válido porque sem a sua existência as áreas ficam sujeitas a invasões e a empreendimentos clandestinos, como pode ser visto na região do Campo Grande, em Campinas. “Quando essas áreas são invadidas, existe uma depredação muito maior do meio ambiente, pois acontece o corte de árvores de forma desenfreada e não há respeito às nascentes. Quase metade da cidade foi alvo de áreas de invasão, e a depredação do meio ambiente é quase total”, completou.

O vereador Paulo Gaspar (NOVO) caracterizou a situação como um paradoxo (Foto: Reprodução/TV Câmara)

Segundo Paulo Gaspar, Campinas não tem um plano para combater enchentes, mas está previsto a construção de piscinões e dutos de drenagem, que podem resolver em parte e mitigar o problema. No entanto, para ele, não há uma maneira que resolva 100% o problema, já que a cidade tem áreas compactas e que não possuem um sistema capaz de escoar um grande volume de água.

Paulo caracterizou a situação como um paradoxo, já que ao mesmo tempo que uma cidade compacta e verticalizada é melhor para o meio ambiente, porque é menos espraiada, tem problemas de pouca permeabilidade e uma concentração de asfalto, então sempre haverão problemas com enchentes e alagamentos.

O professor de Hidrologia da Unicamp, Antônio Carlos Zuffo, também é a favor do projeto. Segundo ele, esse projeto de lei obedece à uma mudança da política nacional do Ministério da Cidade, pois ela cria na área de expansão algo chamado de “zona tampão”, ou zona de amortecimento, que serve como uma proteção para aquela área de mata, que seria ocupada de forma ilegal. Antônio citou como exemplo o bairro Paraisópolis, em São Paulo, que cresceu em áreas que deveriam ser de proteção ambiental, mas que foram invadidas de forma ilegal.

“Temos o contraste entre o bairro de classe alta, o Morumbi, e o de comunidade, Paraisópolis, isso porque não existiu essa faixa de transição. Isso significa que lotes grandes são separados por essas faixas de preservação, e são invadidos justamente pela falta de opção de moradia popular”, explicou.

O professor de Arquitetura e Urbanismo da PUC Campinas, Fábio Muzetti, alegou ser neutro sobre a aprovação do PLC. Ele alegou que a área central de Campinas possui diversos problemas de inundação, já que possui um rio canalizado embaixo de uma rua de paralelepípedo histórica. Para ele, as reformas teriam de começar da área central, ao invés de expandir a área urbana.

“Tecnicamente, o papel do Executivo e da Câmara foi feito, se é bom ou não, aí nós vamos entender um pouco melhor com o passar dos anos. A zona rural em Campinas é complicada, se olhar pros lados, tem Sumaré e Hortolândia, então Campinas tá esmagada no meio das cidades vizinhas. Não dá pra falar só de Campinas quando fala sobre moradia, tem que olhar pra Valinhos, Jaguariúna…é muito mais complexo do que a forma como foi tratado. Isso tem que ser discutido de forma metropolitana, não só na cidade, tem que olhar o conjunto”, complementou o professor.

Vereadores explicam os motivos do voto contrário e favorável ao PLC

Ao todo, foram 29 vereadores presentes na votação, sendo 23 deles a favor e 6 contra a aprovação do projeto.

Votaram contra: Cecílio Santos (PT), Guida Calixto (PT), Gustavo Petta (PCdoB), Mariana Conti (PSOL), Paolla Miguel (PT) e Paulo Bufalo (PSOL).

Votaram a favor: Arnaldo Salvetti (MDB), Carlinhos Camelô (PSB), Carmo Luiz (Republicanos), Edison Ribeiro (União Brasil), Eduardo Magoga (Podemos), Edvaldo Cabelo (PL), Fernando Mendes (Republicanos), Filipe Marchesi (PSB), Higor Diego (Republicanos), Jair da Farmácia (Solidariedade), Jorge Schneider (PL), Juscelino Barbarense (PL), Major Jaime (União Brasil), Marcelo Farmácia (PSB), Marcelo Silva (PP), Marrom Cunha (MDB), Nelson Hossri (PSD), Otto Alejandro (PL), Paulo Gaspar (Novo), Paulo Haddad (PSD), Permínio Monteiro (PSB), Rodrigo Farmadic (União Brasil) e Zé Carlos (PSB).

Orientação: Prof. Gilberto Roldão

Edição: Giovanna Sottero


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