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Editor de O Globo, Miguel Caballero critica “briga de foice” na Semana Nacional de Jornalismo
Por Renan Fiorentini
O deadline de uma reportagem, isto é, o prazo que um repórter tem para entregar o material, que antes era de horas ou dias, passou a ser contínuo. Esta é a observação que pontuou a participação do jornalista Miguel Caballero, editor do jornal O Globo, na mesa-redonda “O papel do repórter, novos processos de apuração, vantagens e riscos: a ética no exercício da profissão”, na segunda-feira, 27. O evento, que reúne vários outros profissionais de jornalismo está sendo promovido pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI).

Para o comunicador, a necessidade de publicação em tempo real passou a ser imposta nas redações. “Jornalismo diário já é uma expressão anacrônica, é o jornalismo de minutos. Os repórteres trabalhavam com deadline, hoje o deadline é contínuo. Você está publicando aquele assunto com dois, três títulos”, ressaltou.
Ainda segundo Caballero, a concorrência pelo “tempo de tela” dos leitores é o que ocasiona essa instantaneidade dos veículos. “É todo mundo concorrendo nessa briga de foice pela atenção das pessoas”. Apesar do grande volume de produção noticiosa, o jornalista defende que é importante saber diferenciar opinião de jornalismo.
“As redes sociais fazem a gente consumir indistintamente notícia e opinião, mas o algoritmo engaja mais a opinião. Muitas vezes, a gente acaba se informando por opinião, lendo a opinião daquele fato antes de tomar conhecimento do fato”, alertou o professor, que considera esse fator como um risco para o jornalismo.
Miguel Caballero também disse perceber a ausência de reportagens de qualidade. Ao tratar do jornalismo esportivo, ele relata que “antigamente, você tinha reportagens. Hoje em dia é uma mesa redonda atrás da outra, o dia inteiro, ao vivo. É muito mais barato de produzir. É muita opinião e pouca reportagem”.

Para Caballero, a instantaneidade também prejudica no dia-dia das redações, já que existem menos reuniões de pauta e debates do que deve ser noticiado ou não. “Essa velocidade cada vez maior é algo que os veículos vão precisar pensar”.
A necessidade da publicação em tempo real contrasta com uma outra realidade discutida no evento: os vazios noticiosos. De acordo com o Atlas da Notícia, 2.968 municípios brasileiros são “desertos”, isto é, não dispõem de nenhum veículo de informação jornalística local. O número representa 29,3 milhões de pessoas, ou seja, 5 em cada 10 cidades do país.
Para a jornalista Maristela Crispim, idealizadora da agência de conteúdo Eco Nordeste, a existência de um veículo jornalístico não pressupõe, necessariamente, a produção de jornalismo de qualidade, principalmente em municípios menores. “A maioria desses noticiosos locais faz uma mera reprodução de conteúdos. Essa é uma realidade para a qual a gente não pode fechar os olhos”.
“Há veículos, mas veículos com poucos recursos vão ter poucas condições de produzir conteúdos próprios”, exemplificou a jornalista, que expôs os perigos do apoio de empresas e do governo. De acordo com o Atlas da Notícia, o estado de Roraima registra a menor quantidade de veículos jornalísticos. Nele, foram identificados apenas 36 veículos, o que corresponde a 0,3% do total nacional. Situação parecida ocorre no Amapá (52 veículos), Acre (89), Sergipe (105) e Rio Grande do Norte (120). São Paulo tem a maior parte dos veículos: 18%.
A mesa também contou com a participação dos jornalistas Laurindo (Lalo) Leal Filho, Alexandre Medeiros e Marina Amaral, que destacaram a importância do trabalho do repórter e a necessidade desse profissional na sociedade. “Ou você faz jornalismo pra transformar a sociedade, ou vai fazer uma outra carreira, que não tenha esse comprometimento e essa necessidade”, destacou Lalo Leal.
“Repórter é a vertente da nossa profissão que não morrerá jamais. Nem o chat [referindo-se ao ChatGPT, de inteligência artificial, disponível na internet] vai substituir um bom repórter”, expôs Alexandre Medeiros. A demanda por informação também foi destacada pelos profissionais.
“A essência do repórter de ter curiosidade, critério, ética, e a função social do jornalista eu vejo como imunes ao avanço tecnológico”, concluiu Miguel Caballero. O encontro foi mediado pelo jornalista João Batista de Abreu.
A 1ª Semana Nacional de Jornalismo segue até o dia 31 de março. É possível participar presencialmente, na sede da ABI, no Rio de Janeiro (RJ), ou de forma remota, pelo canal da entidade no YouTube: https://www.youtube.com/@ABITVweb/streams.
Orientação: Prof. Carlos Alberto Zanotti
Edição: Melyssa Kell
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