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Para Nilton Bonder, a preocupação consigo próprio caminha em sentido contrário ao conceito de comunidade
Por: Larissa Fortunato
O escritor Nilton Bonder, autor de 27 obras traduzidas para vários idiomas e doutor em literatura hebraica, criticou o que chamou de “sociedade de direitos”, na qual o exercício da cidadania está ligado ao atendimento de demandas específicas. “Comunidade é o oposto disso”, afirmou em conferência gravada para o programa Café Filosófico, no auditório da CPFL-Campinas, na noite da última quinta-feira (11).
Recorrendo aos argumentos do sociólogo francês Edgar Morin, que levanta a hipótese de uma “cidadania terrena”, Bonder propôs que a sociedade abrace a ideia de que “todos somos cidadãos do planeta Terra”, não havendo sentido em classificar raças, nacionalidades, etnias, gênero ou mesmo se o ser vivente pertence ao reino animal ou vegetal.
“Nós trabalhamos hoje a solidariedade de forma mercantil: eu sou solidário com você, e você é solidário comigo”, exemplificou o conferencista ao apontar que relações dessa natureza vão na contramão do sentido da bondade. “Sem a gente perceber, a gente é gentil, solidário, leal, mas a gente não produziu algo que contém uma bondade”, alegou o escritor.
Ao trabalhar os valores de bondade, Bonder, que é rabino, explicou o ato como “a capacidade de considerar os interesses do outro maiores que seu próprio interesse”. Ele criticou que as pessoas estejam desempenhando seus papéis em sociedade na busca por recompensas e pelo reconhecimento. “Eu acabo sendo solidário para atender a mim mesmo”.
Bonder pontuou também que a sociedade já vive uma era posterior ao antropoceno, quando o homem era considerado o centro do universo, tendo “evoluído” para o que chamou de tecnoceno – período no qual a tecnologia passa a ter o controle sobre a vida das pessoas. Já não é possível saber se o desenvolvimento corresponde à consciência humana ou se ele se tornou um pesadelo de ficção científica, comentou, no qual “o robô vira inimigo do próprio ser humano, controlando-o”.
“Se eu pegar o meu celular, eu me surpreendo com os aplicativos que baixei. São a minha cara, têm todas as coisas em que eu vou me enredando em uma teia de coisas que facilitam a minha vida. Todos nós sabemos que elas facilitam, mas a minha vida começa a ficar tão ali, presa àquelas coisas, que eu não tenho mais uma leitura clara se elas facilitam ou se elas consomem meu tempo, minha energia”, disse Bonder.
O escritor afirmou ainda que o desenvolvimento tecnológico tem levado a sociedade a viver em “bolhas”, nas quais os usuários e os próprios algoritmos excluem a participação da diversidade. “Isso não é comunidade. Isso é… máfia”, ponderou. Comunidade, segundo frisou, diz respeito a pensar, antes de tudo, no outro, na diversidade do que compõe a vida em toda a extensão do planeta.
Bonder lembrou que o termo “evolução” não significa necessariamente o avanço para um estágio superior. “Estamos evoluindo, sem dúvida, mas não quer dizer que chegaremos a um lugar melhor”, comentou ao lamentar episódios de violência e de danos ao meio ambiente. “Cada um de nós tem uma consciência e tem que cair a ficha de que tem algo errado”, advertiu.
Aqui, acesso à íntegra da conferência de Nilton Bonder.
Orientação: Prof. Carlos A. Zanotti
Edição: Bruno Costa
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