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Para o psiquiatra Neury Botega, estilo de vida tem agregado risco à pré-disposição biológica
Por: Bianca Velloso
Ficar “deprê”, triste ou desestimulado não tem nada a ver com a doença depressão, ainda mais no cotidiano assolado por uma pandemia que tem atingido a proporção de catástrofe no Brasil. A ponderação foi feita pelo psiquiatra Neury Botega, na abertura da série “Transtornada Mente”, quinta-feira, 8, em palestra online no projeto Café Filosófico, da CPFL-Campinas, programa que é levado ao ar pela TV-Cultura de São Paulo.
Botega, professor titular do Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, disse que a depressão tem aumentado acentuadamente entre os mais jovens. Segundo ele, a perda de referenciais desencadeada pelos valores da modernidade – quando as pessoas já não levam em consideração a tradição transmitida pelos pais, professores ou o conhecimento científico – associada ao uso intensivo de redes sociais tem funcionado como um gatilho para as pré-disposições de natureza biológica.
“Já criaram até a tal ‘depressão do Facebook’ para descrever o que acontece com as pessoas que se espelham nas redes sociais”, disse o psiquiatra. De acordo com Botega, em função da perda das referências alicerçadas na tradição, os jovens têm buscado referência nas redes sociais, onde encontram apenas gente sorrindo, curtindo a vida, em lugares aprazíveis.
“As pessoas tiram 30 selfies, escolhem a melhor, onde estão mais felizes, e publicam”, observou. Isso dá a impressão – segundo o psiquiatra – de que tudo está muito bem com todo mundo, “exceto comigo”. “É problemático achar que a verdade está ali, no Facebook”, advertiu.
Além das expressões de felicidade, as redes sociais e os valores da modernidade também passaram a incentivar o culto à beleza e boa forma física. “O corpo passou a ser uma das divindades da pós-modernidade”, disse Botega ao observar que a busca – muitas vezes inatingível – pelo corpo perfeito tem o poder de funcionar como um gatilho para quadros depressivos. No entanto, segundo ele, a depressão nunca é apenas isso.
“A depressão é uma combinação de pré-disposição biológica com acontecimentos de vida, que são os chamados gatilhos. O efeito é uma combinação de causas. Para depressão, temos que pensar em multicausalidade, e não em uma causa única”, enfatizou o psiquiatra.
De acordo com Botega, o estilo de vida contemporâneo, com a aceleração do tempo e as exigências de sucesso impostas ao cotidiano, só tem feito aumentar os quadros depressivos mais intensamente entre jovens do que entre os mais velhos. Esse gatilho acaba se somando à pré-disposição, o que leva o paciente “ao niilismo, à falta de sentido em sua própria existência”, quando se instaura o quadro patológico depressivo.
De acordo com o psiquiatra, ao mesmo tempo em que facilitou a comunicação entre as pessoas, a intensa utilização da tecnologia em atividades remotas, em função da pandemia, só agravou as condições de sobrevivência em “uma sociedade imediatista”.
“Houve um borramento do limite entre o trabalho e o tempo pessoal”, observou o psiquiatra, pois as pessoas em trabalho remoto passaram a estar disponíveis o tempo todo, em suas casas. “Éramos mais felizes antes do whatsapp”, brincou ao aconselhar que o mundo do trabalho não deveria invadir a privacidade dos lares. “Precisamos de um tempo para descansar, para refletir”, o que teria se tornado impossível com a intromissão das redes digitais profissionais no ambiente doméstico.
Ao responder perguntas do público online, Botega observou que há um grande desafio no pós-pandemia, especialmente entre crianças e adolescentes que foram afastadas – em função do distanciamento social – do processo de aprendizagem e socialização que o ambiente escolar oferece. “Temos como desafio recuperar conteúdos, experiências e vivências das quais os estudantes foram privados”, avaliou.
Aqui, link para a conferência de Botega, no YouTube.
Orientação: Prof. Carlos A. Zanotti
Edição: Oscar Nucci
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